CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 15 A 21 DE AGOSTO DE 2013
CAPA
P
G
8
EDUCAÇÃO
O Tribunal de Contas do Estado (TCE) cancelou a licitação de R$ 7,7 milhões feita pelo secretário de Educação Ságuas Moraes (PT)
para contratação de serviços de buffet com cardápios requintados. Mesmo diante do flagrante disparate da licitação, Ságuas
apresentou um argumento irônico. “O valor do salmão estava mais barato que a do pintado”. A licitação milionária se contrapõe ao
cenário dramático da Educação em MT. Escolas depredadas, obras inacabadas, professores em greve e inclusive crimes dentro dos
estabelecimentos de ensino.
Por: Mayla Miranda e Sandra Carvalho. Fotos: Pedro Alves
Ságuas, salmão, salários e sangue...
Com a imagem
bastante desgastada após
oito anos à frente da
Seduc, o secretário Ságuas
Moraes diz considerar o
edital de R$ 7,7 milhões
para a contratação de
serviços de buffets
totalmente natural, mesmo
a secretaria pagando,
neste caso, R$ 28 por
pessoa, enquanto gasta
na merenda escolar
A morte do estudante
Paulo Eudson Félix, de 17
anos, assassinado com
seis tiros dentro da Escola
Municipal Gastão Matos
Muller, no bairro Pedra
90, em Cuiabá, aponta o
grave problema da falta
de segurança dentro das
escolas e nas
proximidades das
instituições de ensino no
Estado. De acordo com a
polícia, a morte do jovem
seria resultado de um
acerto de contas
envolvendo drogas. Outro
fator bastante preocupante
é que o jovem não era
aluno da escola, o que
revelou a facilidade de
acesso por pessoas sem
vínculo com a instituição.
Para a
psicopedagoga Zoraide
Figueiredo, o descaso das
escolas para com o
problema que se agrava
diante dos olhos é
evidente, o que pode
Educação em greve e
440 mil alunos sem aula
Em greve desde o dia 12 de agosto, os profissionais
da rede pública estadual de ensino alegam que muitos
itens da pauta de reivindicações da categoria estão sendo
analisadas pelo governo há mais de um ano, sem nenhum
retorno plausível. Aproximadamente 35 mil professores
aderiram ao movimento. São 739 escolas em greve com
aproximadamente 440 mil alunos fora das salas de
aula.
Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores do
Ensino Público de Mato Grosso (Sintep/MT), Henrique
Lopes, a Seduc está desrespeitando a Constituição do
Estado. “Não há transparência, a receita está sendo gasta
com o ensino superior, isso está errado”, declara Lopes.
O secretário da entidade, Gilmar Soares, observa por
outro lado que greve também é em razão de as escolas
estarem “em situação de calamidade, em situação crítica”.
Como exemplo o sindicalista cita a educação de Várzea
Grande, que “há dez anos não abre uma escola pública,
fecha turmas de ensino fundamental. Há escolas que têm
notebooks, ar-condicionado, porém a infraestrutura faz
com que esses materiais dos alunos fiquem encaixotados,
pois as salas estão fora do padrão de uso para esses
equipamentos”, desabafa.
De Primavera do Leste, a merendeira Rosangela
Freitas justifica o movimento como justo retratando
indignação e se revolta com a “falta de interesse dos
governantes com os educadores e os estudantes. Eles
tratam com indiferença o pedido da categoria”. Há 28
anos como professora de Cuiabá, Cristiane Gonzalez, 46,
está descrente quanto ao retorno do governo. Sem
otimismo, diz: “Nesse momento não acontecerá nada, já
que o governo não cede”.
Já a sua colega técnica administrativa Aide Maria da
Silva ressalta que o governo “não atua apenas com o
mérito da pessoa sem que se faça uma reivindicação, sem
luta”. E decepcionada justifica o momento em que se
obteve o aumento: “O governo, ao cumprir, fez o
aumento sair em parcelas, como
prestações”. (Colaborou: Valquiria Castil)
Sem segurança, escolas viram caso de polícia
significar negligência por
parte dos gestores. Ainda
de acordo com a
psicopedagoga, não é
novidade para ninguém a
organização de jovens nas
redes sociais mostrando
seus feitos violentos.
Para a especialista, já
passou da hora de o
Estado trabalhar a
prevenção dessas atitudes.
“Não é concebível que se
ignore este problema de
violência tão sério diante
dos olhos. A direção da
instituição tem de se
preocupar, além de
organizar o ambiente
escolar, e também cobrar
mais efetividade dos
gestores”, cobra a
profissional. O sociólogo
Naldson Ramos, doutor e
professor da Universidade
Federal de Mato Grosso
(UFMT), acredita que o
enfraquecimento da
sociedade e dos valores
constituídos com ela levou
a este cenário devastador.
A falta de referenciais
familiares também
colabora para o
fortalecimento das atitudes
negativas dos jovens.
Tudo isso, aliado às
péssimas condições das
instalações, ainda
contribui para baixar a
autoestima dos alunos e
fomentar a revolta e a
violência. “Um ato de
violência por si só não
justifica ou explica essas
atitudes; é, sim, uma
situação que a gente
chama de abandono
dessas crianças pela
família e pela própria
sociedade, e pela
ausência de políticas
públicas e às vezes até
mesmo pelos próprios
professores”, enfatiza o
sociólogo. Já na questão
que se refere aos
professores, Naldson
Ramos faz questão de
ressaltar que a falta de
condições do profissional
por muitas vezes o faz
tratar os alunos de forma
homogênea, sem levar em
consideração suas
necessidades individuais,
o que gera ainda mais um
sentimento de
autoafirmação nesses
jovens. Sem identificar os
padrões de
comportamento dos quais
está se desviando, o
jovem acaba se sentindo
ainda mais sozinho e sem
uma devida orientação
também nas escolas para
tomar as suas decisões.
Ainda bastante
assustados com a morte
recente do jovem, pais de
alunos da escola Gastão
Muller se aglomeram na
porta da instituição para
buscar seus filhos. Para a
dona de casa Anain da
Silva, manter a filha de 8
anos na escola tornou-se
uma preocupação. “A
gente traz o filho para a
escola e não sabe o que
pode acontecer com ele, é
muito difícil conviver com
esta violência em um local
que deveria ser somente
de educação e
tranquilidade para os
pais”, desabafou.
Já o segurança
aposentado Valmir de
Melo atribui o problema
das escolas ao abandono
do Poder Público em
relação aos mais
necessitados. “É só você
olhar esta escola para ver
que tem como entrar
facilmente e fazer o que
quiser. O mato toma
conta e o muro baixo não
protege as crianças. E
outra: são as professoras
que abrem o portão para
a entrada e saída dos
alunos. Se um guri tenta
entrar aqui armado, o que
elas poderão fazer?”,
questiona o pai
indignado.
apenas R$ 0,30 por
aluno. As empresas que
haviam vencido a
licitação, cancelada pelo
Tribunal de Contas do
Estado (TCE), foram a Ana
Paula Farias Alves - ME
(Real Buffet) e Laice
Pereira - ME
Detalhe: enquanto em
muitas escolas estaduais
os alunos comem pão
com manteiga e bebem
suco, no cardápio
milionário de Ságuas
Moraes há entrada com
pão sírio ou pãezinhos
integrais acompanhados
de pasta de berinjela,
seguidos de salada de
mariscos ou tropical de
maionese e legume, e, no
prato principal, medalhão
de filé bovino com molho
madeira, peito de peru à
Califórnia (com frutas),
salmão ao molho tártaro
ou filé de badejo ao
molho de maracujá.
Segundo o secretário,
o valor do salmão em
Cuiabá estava mais
barato que o do pintado,
por isso eles o incluíram
no cardápio dos buffets.
“O salmão estava
custando R$ 21 o quilo
enquanto o pintado
chegava a custar R$ 25”,
justificou o petista. E jogou
a culpa na Secretaria de
Administração (SAD) por
ser a pasta a responsável
pela pesquisa de preços e
elaboração dos
cardápios.
Por outro lado, um
fato estranho está sendo
apurado pelo Ministério
Público Estadual além do
contrato milionário.
Ocorre que a empresa
Laice Pereira - ME, como
apurou o
Circuito Mato
Grosso
, não foi
localizada em nenhum
dos endereços
disponibilizados na
internet e tampouco na
Receita Federal ao ser
consultado o CNPJ da
empresa. A mesma
empresa já faturou R$ 10
milhões durante o
Governo Silval Barbosa.
P r o f e s s o r e s da r ede e s t adua l p r o t e s t am con t r a con t r a t ação de R$ 7 , 7 mi l hõe s
em bu f f e t de l uxo pe l a Sec r e t a r i a de Educação
Para o secretário Ságuas Moraes a contratação dos serviços de luxo é totalmente
natural, mesmo os alunos da rede recebendo uma alimentação no valor de R$ 0,30
Com medo da c r e s cen t e v i o l ênc i a na s e s co l a s , o s pa i s s e
ag l ome r am na po r t a da s i n s t i t u i çõe s à e s pe r a do s f i l ho s