EDIÇÃO IMPRESSA - 482 - page 6

CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 3 A 9 DE ABRIL DE 2014
POLÊMICA
P
G
6
PAC DA SAÚDE
Quase metade das ações prometidas para o Estado continua no papel, ou seja, em estudo, licenciamento ou em processo de contratação
MT concluiu apenas 11% das ações
Casos aumentaram
300% em Mato Grosso
Na
edição
481
o
Circuito
Mato Grosso
mostrou que
aumentaram em
300% os casos
de erros
médicos no
Estado nos
últimos 13 anos,
e dos processos
que correm na
Justiça, 49%
dos médicos são
condenados.
Contudo,
pacientes que
passam pela
situação
raramente são
ressarcidos
pelos danos
causados.
E segundo
o Conselho Regional de Medicina (CRM), nos últimos
cinco anos 126 médicos passaram por algum tipo de
processo dentro do conselho, sendo que quatro
chegaram a perder o direito de exercer a profissão.
Outro dado que espanta é o fato de 8,5% dos médicos
de Mato Grosso estarem respondendo a algum tipo de
processo, um número considerado alto em relação à
média nacional que é de 7%. A pesquisa faz parte do
livro “Erro Médico e Judicialização da Medicina”, do
autor e advogado Raul Canal, que alerta para os
problemas estruturais e de capacitação de todos os
médicos, até mesmo da rede privada.
Vítima luta contra médico de SP
Experiente na área
médica, a enfermeira
Zoraide Alves dos Santos,
que reside no município de
Cáceres, Oeste de Mato
Grosso, viu durante anos
pacientes lutando pela vida
e, quando ela menos
esperava, presenciou a filha
passando pela mesma
situação. Jennifer Cristina
dos Santos, 24 anos, foi
vítima de erro médico e não
conseguiu ser salva. Agora,
a mãe busca na Justiça a
condenação do médico para
evitar que outras pessoas
passem pela mesma
situação. Tudo começou em
2012. Jennifer Cristina
precisou faz um transplante
de rim na cidade de São
Paulo. Na época a cirurgia
foi considerada um sucesso
e logo a paciente retornou
para Cáceres, porém depois
de umas semanas ela
começou a ter infecções,
precisando assim retornar
para São Paulo para ser
acompanhada no hospital
onde fizera a cirurgia.
De acordo com
Zoraide, seria necessário
que a filha tomasse
antibióticos por um tempo
até recuperar a saúde
completa, mas que era uma
situação de rotina. “Nós já
sabíamos que havia o risco
de ela ter alguma infecção,
então ter que voltar para São
Paulo não foi nada que nos
amedrontou, e como eu
estava acostumada, sabia
dos processos que iria levar
até a recuperação total dela”,
lembra a enfermeira.
No entanto, no segundo
dia de internação, sem
conversar com a família, o
médico aplicou duas doses
de morfina na jovem.
“Minha filha não estava
sofrendo com dores. E
quando ela percebeu o que
estava acontecendo não
parava de falar: ‘Mãe, não
deixa eu morrer, eu não
quero morrer’, mas eu não
podia fazer nada”, lamenta
Zoraide. Não demorou
muito até ela presenciar a
filha falecendo e então
iniciou a luta de entrar com
o processo contra o médico.
Antes de voltar para Cuiabá
ela conseguiu todo o
prontuário da filha, o que a
ajudou a ganhar duas
audiências na Justiça.
O OUTRO LADO
À época o hospital onde
o fato ocorreu esclareceu
que deu todo o atendimento
necessário à paciente no
transplante. A unidade
afirmou que depois na
recuperação que em outubro
do ano passado, ela retornou
em estado grave e morreu.
A direção do hospital
informou ainda que a
instituição é referência em
transplantes no país pelo
serviço de excelência
prestado à população.
ERRO MÉDICO
Casos levam até 15 anos na Justiça
Rafaela Souza
Casos de pacientes que
sofreram com erro médico
podem demorar até 15 anos
na Justiça, e poucos
conseguem sucesso na
ação, pois os pacientes
acabam sendo reféns dos
peritos médicos que
procuram não incriminar os
colegas de trabalho. Essa foi
a constatação do defensor
público Claudio Aparecido
Souto, que está com 10
casos correndo na Justiça
sem resposta, há cinco
anos. Para o defensor
público, a principal questão
que impede que os casos
sejam mais ágeis é o fato de
os peritos serem
profissionais ligados de
alguma maneira aos
médicos, daí o órgão tem de
recorrer a outros meios.
“Diante desse
Entre os principais casos estão aqueles em que o médico esquece algum objeto dentro do corpo do paciente
corporativismo, quando
chega um caso de erro
médico na Defensoria,
sempre buscamos entrar
com ação contra o Estado
ou o Município para que
eles se responsabilizem pelo
dano causado ao paciente.
Apesar de ser uma tática
mais garantida, demora
muito para se obter um
resultado, já que o
Executivo sempre recorre
da decisão Em
compensação, o Estado vai
ter de brigar na Justiça para
provar que o erro foi do
médico”, explica Souto.
Entre os três principais
casos que estão sendo
defendidos pelo defensor,
estão pessoas que após
cirurgia descobriram que os
médicos deixaram algum
tipo de equipamento dentro
do paciente. “Esses casos
são os mais fáceis de ganhar
na Justiça, porém com a
morosidade pode levar até
15 anos para saber quem é o
culpado, no caso o médico
ou a administração pública.
Os três casos que tenho
nesse gênero já estão há
cinco anos tramitando sem
resposta”, conta.
Esses mesmos
empecilhos apresentados
pelo defensor público foram
encontrados também pela
Associação de Vitimas de
Erros Médicos (Avem),
como o
Circuito Mato
Grosso
mostrou na edição
passada. De acordo com a
presidente da Avem, Maria
de Fátima Oliveira, dos 200
processos em andamento,
apenas três tiveram sucesso
nos dez anos de atuação da
instituição. “Nós temos três
advogados atuando aqui em
Cuiabá que buscam na
Justiça uma maneira de as
famílias e as vítimas que
ainda estão vivas serem
ressarcidas e que os
médicos se responsabilizem
pela falha. Além disso,
temos ainda um advogado
emBrasília para
acompanhar os casos que
vão para última instância,
mas não tem sido fácil a
batalha”, lamenta Oliveira.
Sandra Carvalho
OConselho Federal de
Medicina (CFM) denunciou
esta semana que apenas
10,8% das ações previstas
no Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC 2)
para a área da saúde no
estado de Mato Grosso
foram concluídas desde
2011, ano de lançamento da
segunda edição do
programa.
O dado é embasado em
relatórios oficiais do PAC 2
que revelam ainda que dos
777 projetos selecionados
para o Estado, todos sob
responsabilidade do
Ministério da Saúde ou da
Fundação Nacional de Saúde
(Funasa), apenas 84 foram
concluídos até dezembro do
ano passado.
O CFM criticou o baixo
desempenho dos projetos –
MOTORISTA FAZ ‘VAQUINHA’ PARA
CONSERTAR PNEU DE AMBULÂNCIA
Um fato ilustra a falta de investimento da saúde pública
emMato Grosso. O motorista de uma das ambulâncias que
atende uma unidade de saúde da Secretaria de Estado de
Saúde de Mato Grosso foi obrigado a fazer uma ‘vaquinha’
esta semana com os colegas de serviço para consertar o
pneu do veículo oficial. Isto porque ele recorreu à SES
para viabilizar o conserto com urgência – por se tratar de
uma ambulância – e simplesmente foi informado que
deveria pagar o serviço com o dinheiro do próprio bolso e
que depois veriam uma forma de reembolsá-lo.
Resultado da falta de investimentos
Obaixo índice de
execução do PAC 2 para a
área da saúde não surpreende
o CFM. Em 2013, dos R$
47,3 bilhões gastos com
investimentos peloGoverno
Federal, oMinistério da
Saúde e suas unidades
vinculadas – dentre elas a
Funasa – foi responsável por
apenas 8%dessa quantia.
Com base em dados do
Sistema Integrado de
AdministraçãoFinanceira
(Siafi), o CFMrevelou que,
dentre os órgãos do
Executivo, a Saúde aparece
emquinto lugar na lista de
prioridades no chamado
“gasto nobre”. Conforme os
valoresmédios praticados
peloMinistério da Saúde, é
possível dizer que com esses
R$ 47,5 bilhões seria possível
adquirir 386mil ambulâncias
(69 para cadamunicípio
brasileiro); construir 237mil
UnidadesBásicas de Saúde
(UBS) de porte I (43 por
cidade); edificar 34mil
Unidades de Pronto
Atendimento (UPA) de porte I
(seis por cidade) ou, ainda,
aumentar em936 o número
de hospitais públicos de
médio porte.
reflexo do subfinanciamento
crônico da saúde e da má
gestão administrativa no
setor. “Mais uma vez os
números do próprio governo
confirmam o que o conselho
tem denunciado à
sociedade”, diz o corregedor
e conselheiro federal por
Mato Grosso José Fernando
Vinagre.
Ele acrescenta: “A
saúde definitivamente não é
uma prioridade no Brasil.
Onde e como os médicos
vão trabalhar se as unidades
de saúde prometidas há mais
de três anos sequer saem do
papel?”, questiona.
Segundo Vinagre, quase
metade (45%) das ações
programadas para o Estado
no período de 2011 a 2014
continua nos estágios
classificados como “ação
preparatória” (estudo e
licenciamento) ou “em
contratação”.
Enquanto isso, 344
ações constam em obras ou
em execução, quantidade
que representa 44% do total.
“Numa perspectiva otimista,
mesmo que o Governo
Federal consiga concluir os
projetos em andamento, o
programa chegará ao fim
deste ano sem cumprir a
metade do prometido”,
avaliouVinagre.
Os 84
empreendimentos
concluídos fazem com que
o estado apareça em 13º
lugar na lista de unidades
federativas com o maior
número absoluto de obras
inauguradas. Em termos
percentuais, o estado
aparece com desempenho
similar à média nacional
(11%).
Em 2011, foram
prometidas construção e/ou
ampliação de 445 UBSs, das
quais apenas 25 (6%) foram
concluídas. Também
estavam previstas 18 UPAs,
mas, até dezembro de 2013,
uma única unidade havia
sido concluída. Também
constam no programa
iniciativas de saneamento
voltadas para a qualidade da
saúde em áreas indígenas,
rurais e melhorias sanitárias
nas cidades. Dentre as 314
ações desta natureza, 58
foram entregues.
Por falta de assistência hospitalar no interior, prontos-
socorros de Cuiabá e Várzea Grande vivem superlotados
Defensor público Cláudio Aparecido Souto reclama da
morosidade dos processos na Justiça
Fotos: Mary Juruna
Fotos: Mary Juruna
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