CIRCUITOMATOGROSSO
CULTURA EM CIRCUITO
PG 3
CUIABÁ, 4 A 10 DE SETEMBRO DE 2014
Marília Beatriz*
O tempo esfumava-se
nas linhas, entrelinhas e
fendas dos meus pulmões
baleados...
Enquanto inclinei o
galho de uma árvore, e
algumas vezes ocupei
com ele todo o amplo
salão de máscaras, silente
e sólido.
Postei-me silenciosa
agachada ao pé da
acerola. Cuiabá ou
Chapada? Não importa.
Acontece é que marchava
como uma formiga,
arcada ao peso de uma
falha/folha. Desajeitada
segurando o tempo,
pulava de dentro do
ativar-se e prendia o
movimento, em cada
Ternuras e
pneumonia
estremecimento, como
uma máquina
concentrada, porém lenta.
O pulmão dizia adeus ao
ar(te)fato enquanto ar/
ranjei nos jardins e
quintais soprando e
puxando.
O escritório recheado
de comprimidos, livros e
latas desafetas com
palavras graves e sons
destemperados.
Sonhava coisas
primorosas, atada aos
sinos e silvos
pulmonares...
Criava na chuva,
encharcava e perfumava o
ar cheiro de terra, depois
de chuva, pressentia erva
cidreira (precisão de
acalmar) e consentia
guardados.
Ah, meu pulmão
e o cigarro anterior
mais que antigo nas
cantigas boêmias,
tudo que fora, que
chegara a ser, vinha
à tona depois da
chuva. O tempo
puxava das mãos o
bolor que acobertava
as mãos que o
antecederam. O
cigarro sabia do
toque perigoso e
mais conhecido. O toque
das essências era para lá
de fundante. Amante
privado e por igual
desabrido.
Que sabor de magia
havia naquele gesto? Era
o espaço, assim, o
aconchego de fantasmas?
Pergunto: quantas
moçoilas havia dentro de
quem? Quantas estavam
reproduzidas nas orelhas
do espelho? Era claro que
sabia das coisas que
nunca constatava?
Por que surgia o
futuro de memória e me
apareciam sensações tão
antigas, do que seria de
viver e, mais de que lugar
encostava esse saber que
despia vestes de letras e
palavras? Porém a
linguagem dançava de
frente nua e
desacostumada ao
social...
E foi com tal pulmão
cansativo e cansado que
meu rosto despencou de
minhas mãos e a imagem
dividiu-se como cerâmica
no refletir de águas. Não
tenho nada certo. Penso
que mergulhei para buscar
meu rosto de encontro
com meu pulmão. E em
instantes tudo se fechou
sobre mim, quieta e
calmamente...
*Ocupante da
cadeira nº 2 da Academia
Mato-grossense de
Letras, mestre em
Comunicação e
Semiótica PUC/SP.
Final de crise num
dia qualquer em agosto
de 2014.