EDIÇÃO IMPRESSA - 504 - page 6

CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 4 A 10 DE SETEMBRODE 2014
POLÊMICA
P
G
6
PUBLICIDADE OFICIAL
Distribuição deve seguir critérios
Pesquisador da UFMT afirma que veículos de comunicação não podem se privar da independência e critérios técnicos devem
justificar publicidade oficial
Diego Frederici
A comunicação é uma
das ferramentas mais
poderosas de que dispõe a
humanidade. Por meio dela,
construímos significados e
conceitos, materializamos
nossa subjetividade e, na
interação e produção de
discursos entre os sujeitos,
estabelecemos uma relação
que pauta nossas ações no
cotidiano. Diante dessa
importância, os governos
investem pesado na
interatividade entre
instituição e povo, com
objetivos diversos que,
apesar do estabelecimento
de vínculo comercial, não
deve estar associado à área
de jornalismo que pretende
ser “independente”.
A opinião é de um dos
maiores comunicólogos
brasileiros, doutor pela
Faculdade de Educação e
Para o advogado e
presidente da Comissão de
Fiscalização dos Gastos
Públicos da OAB-MT, Ivo
Matias, “todos os órgãos
públicos devemdisponibilizar
ativamente em seu site o
orçamento, balancetes,
contratos e concorrências”,
invocando o Decreto Estadual
1973, de 25/10/2013, que
assegura o direito a
informação de gastos,
inclusive aquelas relacionadas
com investimentos em
publicidade.
“O orçamento é só
figuração e o governo muda-o
de acordo com suas vontades
e conveniências. A transparência poderia ser um dos
caminhos para verificar gastos inclusive com publicidade
oficial, mas dados que deveriam estar em todos os órgãos, na
prática, não estão em quase nenhum”, disse ele.
De acordo com dados do próprio governo de Mato
Grosso, foram gastos em 2013 R$ 46.927.700,49 em
publicidade oficial. Aqui também a TV abocanha a maior
parte dos recursos, ficando com R$ 17.476.117,32, seguida
pelo mercado digital, que deteve R$ 4.850.858,80 no ano
passado. Os jornais impressos ainda se mostram relevantes
nesse mercado de divulgação de dados oficiais, obtendo o
terceiro lugar com R$ 4.259.440,43 – informação que vai de
encontro ao estudo
Global entertainment and media outlook
2014-2018
, publicado pela
PricewaterhouseCoopers
, uma das
maiores auditorias do mundo, apontam que a partir de 2015
haverá crescimento na área, e que até 2018 deverão ser
investidos neste segmento mais de U$$ 773,49 bilhões no
mundo. Sobre a isenção de propagandas, que na avaliação do
advogado “deveriam ter caráter informacional”, ele alerta que
as agências são orientadas a agir de outra forma.
“As propagandas tentam vender o governo e as agências
que cuidam das campanhas já são orientadas nesse sentido”.
Transparência ainda
é um grande desafio
Propaganda oficial não é autopromoção
Publicidade
institucional não pode ser
utilizada para
autopromoção dos
governantes e deve
atender princípios
constitucionais de
impessoalidade e
eficiência, de acordo com
o advogado especialista
em direito administrativo
e ex-juiz eleitoral do
Tribunal Regional Eleitoral
de Mato Grosso (TRE-
MT), José Luís Blaszak,
que recebeu o
Circuito
Mato Grosso
em seu
escritório de advocacia
em Cuiabá.
Segundo o
especialista da área
eleitoral, a propaganda
institucional é sinônimo
de uma acirrada disputa
entre os diversos tipos de
mídias, que buscam sua
fatia na mais importante
fonte de recursos para
organizações dessa
natureza, e dentro do
próprio governo que, na
sua opinião, “tenta
cooptar o máximo
possível de empresas sob
sua influência a partir da
dominação econômica”,
provenientes desse
custeio de campanhas e
peças publicitárias
governamentais.
“A propaganda
institucional é tão onerosa
quanto a privada. Ainda
na licitação para
contratação de agências,
os requisitos não deixam
a desejar em comparação
com clientes particulares.
É uma disputa muito
grande”, diz ele.
A Lei 12232/2010,
promulgada na gestão de
Luiz Inácio Lula da Silva,
dispõe sobre as “normas
gerais para licitação e
contratação pela
administração pública de
serviços de publicidade
prestados por intermédio
de agências de
propaganda”. No entanto,
existem critérios para
isso. No parágrafo 1º do
artigo 13 do dispositivo
legal, por exemplo, há a
exigência de
“apresentação pelo
contratado ao contratante
de 3 (três) orçamentos
obtidos entre pessoas que
atuem no mercado do
ramo do fornecimento
pretendido”.
De acordo com
Blaszak, em anos
eleitorais, deve-se ainda
ter mais cuidado em
relação à publicidade
oficial. Citando a Lei
9504/97, que proíbe a
veiculação de
propagandas três meses
antes da eleição, ele faz
uma análise das
“inaugurações” das obras
de mobilidade urbana
feitas em Cuiabá, dizendo
que a estrutura de evento
montada nessas ocasiões,
que conta com imprensa,
animação de músicos e
lideranças políticas,
também poderia ser
enquadrada numa eventual
ação publicitária.
“Penso que esses
eventos podem sim ser
enquadrados como uma
ação publicitária. Utiliza-
se o mote de uma
inauguração de obra
pública para se fazer um
evento midiático, com
direito à presença de
imprensa e tudo”.
Questionado sobre a
eventual influência que
existe do governo em
relação a veículos de
comunicação, ele também
opina que é “temerário”
que os departamentos
comerciais desses meios
dependam apenas de
publicidade oficial.
“A dependência que
eventualmente existe entre
mídia e poder público
pode muito bem
questionar a isenção de
reportagens e mesmo as
informações repassadas
por suas fontes”, afirma.
Psicologia da Universidade
de Siegen, na Alemanha,
docente e coordenador
operacional do Doutorado
Interinstitucional em
Comunicação Social da
UFMG/UFMT e um dos
fundadores da TV Record
emMato Grosso, Benedito
DielcioMoreira.
Para o professor, que
também leciona na
graduação em comunicação
social pela Universidade
Federal de Mato Grosso
(UFMT), é natural jornais e
revistas venderem seus
espaços de divulgação, pois
são empresas, sendo esta
uma “prática recorrente no
modelo de negócio adotado
pelos veículos brasileiros”.
No entanto, o especialista
afirma que os governos
devem adotar critérios
específicos na veiculação de
publicidade nestes meios e
que ambas as áreas,
comercial e jornalística, não
devem subordinar-se nas
organizações
“independentes”.
“O veículo de
comunicação tem que
primar pela independência.
As áreas comercial e
jornalística devem ser
independentes. Esses
departamentos não devem
se confundir nem se
misturar”, analisa.
No mercado privado, as
empresas que mais
investiram em publicidade,
no ano de 2013, foram
Unilever (R$ 4,6 bilhões),
Casas Bahia (R$ 3,4 bilhões)
e o laboratório Genomma
(R$ 2,5 bilhões), de acordo
com o Ibope.
Números comparáveis
com a publicidade oficial.
Apenas em 2013, foram
investidos mais de R$ 2,3
bilhões nessa modalidade de
veiculação de campanhas e
peças – e estamos falando
apenas do governo federal,
desprezando os recursos
aplicados pelas unidades
federativas e municípios. A
televisão é a campeã dessa
concentração de renda,
podendo-se, inclusive,
inferir que a Rede Globo é
quase uma “anunciadora
estatal”, pois entre 2000 e
2013 ela recebeu nada
menos do que R$ 6 bilhões
do Palácio do Planalto.
O professor da UFMT
sublinha os dados desses
investimentos de publicidade
oficial realizados na mídia.
“Os governos são os
grandes anunciantes. A
verbas públicas para
propaganda são
fundamentalmente as
maiores do país”.
Questionado sobre uma
eventual influência dos
governos na linha editorial
do veículo de comunicação,
Dielcio é taxativo: “Isso não
deveria ocorrer”.
Vender uma boa imagem do governo para a população custou
mais de R$ 46,9 milhões para Mato Grosso em 2013
Benedito Dielcio Moreira,
umas das maiores
autoridades quando o
assunto é comunicação,
disse que departamento
comercial e jornalismo não
devem se misturar
Ex-juiz do Tribunal Regional
Eleitoral deMato Grosso,
José Luís Blaszak afirmou
que o governo tenta
“cooptar” veículos de
comunicação para só
divulgarem notícias positivas
IvoMatias, daOAB-MT,
disse que gastos em
publicidade oficial podem
ser questionáveis pela falta
de transparência do governo
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