EDIÇÃO IMPRESSA - 481 - page 8

CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 27 DE MARÇO A 2 DE ABRIL DE 2014
CAPA
P
G
8
MT DIGITAL
Edital de “carta marcada” no MPE
Caso confirmado o direcionamento do edital, contrato pode ser suspenso ou até mesmo cancelado
Diego Frederici
O promotor de
Defesa do Patrimônio
Público Clóvis de
Almeida, do Ministério
Público Estadual (MPE-
MT), instaurou inquérito
para apurar se houve
‘cartas marcadas’ no
pregão presencial 010/
2013 da Secretaria de
Estado de Administração
(SAD) para terceirização
dos serviços do Centro de
Processamento de Dados
de Mato Grosso
(Cepromat), que tem na
figura do seu presidente,
Wilson Teixeira,
conhecido também como
‘Dentinho’, um dos
grandes entusiastas deste
projeto, o MT Digital.
Na semana passada,
dia 19 de março, após
seis impugnações, o
pregão foi realizado e
sagrou-se vencedora
justamente a Oi, a única
que estava habilitada para
atender a todas as
exigências do referido
TCE pode
suspender e
até cancelar
o contrato
Exagero nas restrições pode
apontar direcionamento
De acordo com o
especialista Jonas Lima,
advogado e consultor
jurídico com atuação em
certames nacionais e
internacionais, assessoria e
consultoria a consórcios, o
direcionamento de uma
licitação deve ser apurado a
começar pela Lei 8.666/93,
que veda as “preferências ou
distinções em razão da
naturalidade, da sede ou
domicílio dos licitantes ou de
qualquer outra circunstância
impertinente ou irrelevante
para o específico objeto do
contrato”. Se o órgão
público – neste caso o
Governo do Estado – tem
argumentos para estabelecer
exigências em razão da sua
necessidade concreta do
serviço ou produto, por
outro lado, explica o
especialista, o licitante deve
saber que a Constituição
Federal dispõe que as
exigências devem se limitar
àquelas “indispensáveis à
garantia do cumprimento das
obrigações”.
“É preciso apurar a
pertinência da exigência em
face da segurança da
contratação, analisando se
existemoutras licitações
similares semaquela
exigência e se o empresário
possui informações
VEJA NO QUADRO ABAIXO O QUE MAIS
MATO GROSSO PODERIA FAZER COM O
DINHEIRO DA LICITAÇÃO SUSPEITA
OQUEÉPOSSÍVELFAZERCOMR$429,8MILHÕES?
Pagar 605.739 salários mínimos
Construir 1.426 postos de saúde equipados
Construir 29.761 salas de aula equipadas
Comprar 15.211 carros populares
Construir 357 km de estradas
Fonte: Impostômetro
Valor poderia construir mais de 11 mil casas populares
O grande deficit da
área habitacional do
Estado – que no final de
2012 era de mais de 78
mil casas, segundo o
Instituto de Pesquisa
Econômica e Aplicada
(Ipea) – poderia
diminuir se os recursos
da licitação suspeita do
MT Digital fossem
utilizados na construção
de casas. De acordo
com cálculo matemático
do site impostômetro
(
),
11.734 casas populares
poderiam ser
construídas no Estado,
levando em conta o
orçamento de R$ 429,8
milhões.
E as possibilidades
não param por aí. Como
uma das unidades
federativas que menos
oferecem saneamento
básico aos cidadãos,
haja vista que de 40% a
52% da população mato-
grossense não dispõem
deste serviço essencial,
de acordo com o
Ministério das Cidades,
mais de 4.464 km de
rede de esgoto poderiam
ser implantados no
Estado.
SAD publicou edital
antes de realizar
audiência pública
A Secretaria de Estado de
Administração (SAD) cometeu um erro
gravíssimo ao publicar o edital 010/2013
sem antes realizar audiências públicas
exigidas especialmente quando há
envolvimento de uma soma vultosa: R$
429,8 milhões.
Somente após denúncia de empresas
interessadas no certame é que a SAD
cancelou o edital e realizou, a toque de
caixa, uma audiência para apresentar o
projeto do MT Digital e que é semelhante
ao projeto entregue pela Oi S.A. ao então
secretário titular da pasta, Francisco Faiad.
O especialista Jonas Silva alerta para a
importância de se averiguar os registros
que antecedem a publicação dos editais.
“As audi ênc i as , comuns em casos de obras
públ i cas ou out ros cont ra tos de grande
porte, estão previstas no artigo 39 da Lei
8.666/93, basicamente como oportunidades
de di scussão sobre ques tões de grande
vulto ou complexidade”, cita o especialista,
observando que elas devem ser amplamente
divulgadas.
Entretanto, esclarece Jonas, ainda que
o empresário não tenha tomado
conhecimento de uma audiência ou uma
consulta pública, ele deve requerer ao
órgão a vi s t a dos autos e cópi as dos
documentos produz idos , como as a t as e
manifestações de empresas que se fizeram
presentes. “Porque nesses momentos
costumam surgir críticas ao futuro edital
da licitação e daí podem começar a
despontar os indícios de direcionamento de
uma licitação”.
adicionais para demonstrar à
administração que é possível
cumprir com as obrigações
do contrato sem a restrição
imposta”, detalha o
advogado. Segundo o jurista,
licitações com características
de ‘cartas marcadas’, isto é,
negociações entre o poder
público e privado com o
objetivo de favorecer
determinada empresa,
normalmente denotam
exigências técnicas que não
são necessárias para o
cumprimento do serviço
proposto pelo Estado, porém
só a organização que
eventualmente seria
favorecida pode atender a tal
demanda. Daí a necessidade,
segundo ele, de justificativas
técnicas plausíveis na
escolha de quem pode ou
não prestar o serviço.
“Em licitações com
indícios de favorecimento,
pode haver ali uma exigência
técnica que não é essencial
para atender à demanda,
colocada justamente como
argumento para contratar a
empresa à qual se pretende
favorecer, tendo em vista
que só ela pode oferecer o
serviço”, diz.
Em relação a uma
licitação feita para um
conjunto considerável de
produtos, obras ou
serviços, no entanto, não
necessariamente poderá
haver direcionamento,
pontua Jonas Silva, desde
que não haja prejuízo para
o todo. “Deve-se alertar
para fracionamentos
ilegais de licitações que
visem, em segundo plano,
apenas burlar a
modalidade licitatória
cabível”.
O Tribunal de
Contas do Estado
(TCE) pode
suspender ou a t é
mesmo pedir o
cancelamento do
cont ra to ent re a
SAD e a Oi S.A. De
acordo com a
assessoria de
imprensa do órgão,
ainda não foi
localizado nenhum
processo na paut a
dos julgamentos já
realizados, até
porque a licitação
ocorreu na semana
passada. Porém,
não descar t a a
possibilidade de
haver algum
processo j á sendo
analisado em alguma
das auditorias do
Tribunal e esta
informação só
poderá ser acessada
posteriormente.
A assessoria
informou que a
investigação pode
ser originária, além
da própria iniciativa
do TCE, do
Ministério Público
de Contas (MPC) ou
do cidadão comum.
edital, pelo valor de R$
429.810.000,00. O valor
inicial proposto pelo Oi
foi de R$ 493.475.873,00.
A
edição 470
do
Circuito
já antecipava a
vencedora da licitação do
MT Digital, na coluna
Pérolas.
A publicação
seguinte,
471
, do dia 19
de dezembro de 2013,
noticiou que um
documento datado de 25
de janeiro de 2012,
enviado ao governador
Silval Barbosa (PMDB) e
ao então presidente da
Assembleia Legislativa de
Mato Grosso (AL-MT),
José Geraldo Riva (PSD),
teria sido usado como
“fonte” principal para o
projeto desenvolvido pelo
Executivo para
modernização dos
sistemas virtuais
utilizados pelo Estado e
pelos cidadãos de Mato
Grosso.
O
Circuito
teve
acesso ao referido
documento e constatou
que informações do
projeto técnico, como a
expertise em soluções
integradas para a
segurança pública, por
exemplo, são muito
semelhantes àquelas que
os técnicos do Cepromat
utilizaram na audiência
pública de apresentação
do Projeto Estratégico de
Modernização
Tecnológica - MT Digital.
Detalhes do estudo
elaborado pela Oi, como
dados e formas de
implantação, foram
utilizados em nota da
assessoria e na
apresentação dos técnicos
da Cepromat, incluindo as
mesmas palavras contidas
no documento a que o
jornal teve acesso.
Em justificativa aos
vários pedidos de
impugnação requeridos
pelas empresas
interessadas no negócio,
o Governo do Estado
afirmou apenas que o
modelo de lote único
“resulta de necessidade
técnica, busca por
redução de custos,
segurança jurídica e
atendimento ao interesse
público do projeto MT
Digital”. Já a Oi,
organização responsável
pela proposta única do
certame, por meio de sua
assessoria, disse que não
iria comentar o assunto.
MT Digital está na mira do promotor de
justiça Clóvis Almeida, da Promotoria
de Defesa do Patrimônio Público do MPE
Wilson Teixeira, presidente do Cepromat, um dos grandes
apoiadores do projeto de terceirização do órgão, tirou
licença de dez dias após a Oi vencer o certame
Audiência
pública do
MT Digital
ocorreu só
após
impugnações
de outras
empresas,
que
exigiram o
que versa a
lei 8666/93
Déficit habitacional em Mato Grosso era de mais 78 mil
casas até 2012. Recursos do MT Digital poderiam
beneficiar mais de 11 mil famílias
Fotos: Mary Juruna
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