CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 11 A 17 DE JULHO DE 2013
POLÊMICA
P
G
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OSS’S
Governo do Estado privilegia OSSs e o cidadão mato-grossense sofre pra encontrar atendimento nos municípios.
Por: Rita Anibal. Fotos: Pedro Alves.
Cada vez mais denúncias e escândalos
Dentre tantos problemas
existentes na saúde pública
em Mato Grosso, a
superlotação e a falta de
leitos são os mais dramáticos.
Os prontos-socorros sofrem
do mal crônico de recursos
escassos e a cobrança direta
do cidadão-usuário que,
segundo o Sistema Único de
Saúde (SUS), deveria ter
qualidade e rápido
atendimento. Macas,
cadeiras e bancos lotam os
corredores do prontos-
socorros de Cuiabá e Várzea
Grande, região
Metropolitano só atende os
pacientes “limpinhos”
PS de Cuiabá realiza 300 cirurgias por mês e recebe só R$1,4 milhão
Silval não cumpre
programa Fila Zero
Criado pelo governador
Silval Barbosa (PMDB) em
abril de 2010, o Programa
Fila Zero era a principal
medida emergencial
adotada no Plano de Ação
da Saúde (PAS da Saúde).
Com o nobre intuito de
facilitar o acesso a uma
saúde pública de qualidade
para a população, ele previa
o fim das filas nos serviços da
saúde de forma que não
ocorressem mais. Além desse
programa, Silval prometia o
Hospital Estadual da Criança
que iria se instalar no prédio
do antigo Hospital das
Clínicas, com atendimento
completo em pediatria e com
80 leitos disponíveis.
Dentro do Programa Fila
Zero, também constava o
Exame para Todos, que
agilizaria o atendimento e
diagnóstico dos exames,
inclusive com contratação de
laboratórios particulares, mas
com tabela de preços do
Sistema Único de Saúde
(SUS).
Com a nomeação de
Pedro Henry para secretário
estadual da Saúde, o
Governo Silval Barbosa
mudou a estratégia que tinha
para o Hospital
Metropolitano de Várzea
Grande: transformá-lo no
Centro de Referência da
Mulher com atendimento,
diagnóstico e tratamento de
todas as doenças femininas,
com 60 leitos e previsão da
realização de 400 cirurgias/
mês. A realidade é que o
Hospital atende a poucos,
com cirurgias escolhidas e a
preço diferenciado.
O Plano Estadual
também previa a ampliação
e melhoria qualitativa da
atenção e o fortalecimento
do sistema estadual de
vigilância à saúde.
Passados dois anos do
lançamento, o governo Silval
Barbosa iniciou 2013 dando
calotes nos recursos da
atenção básica de saúde dos
municípios, promovendo
tratamento diferenciado para
as OSSs, inclusive
financeiramente, em
detrimento do atendimento
universal do cidadão, o que
aumentou a judicialização do
SUS, com pacientes
reclamando atendimento e
remédios por via judicial.
O médico Kamil
Fares, secretário de
Saúde de Cuiabá,
também relata problema
semelhantes: “Nós
recebemos os mais
diversos casos,
principalmente os
traumatizados. Temos
250 leitos comuns que
estão ocupados 24 horas
durante todo o ano. A
demanda é muito
grande”. Relata o
secretário que o
atendimento tem que ser
feito mesmo em
condições precárias, pois
o estado e o município
não podem se negar a
atender. O PS de Cuiabá
presta atendimento a mais
de 3 mil pessoas por mês,
oriundas de todos os
cantos do estado, além
de realizar mais de 300
cirurgias/mês, a maioria
de relativa complexidade,
principalmente as traumo-
ortopédicas. Somente na
capital, o número de
acidentes envolvendo
motociclistas vem
crescendo a cada mês,
provocando mortes e
muitos sobreviventes com
sequelas que necessitam
de tratamentos
prolongados e caros.
Mesmo subordinados
à Secretaria Estadual de
Saúde, o modo de
prestação de
atendimentos é
diferenciado: o Hospital
Metropolitano atende
casos pontuais, não
atende emergências nem
resgates do Samu; já nos
prontos-socorros, o
atendimento é
universalizado e absorve
todas as emergências e
resgate que são
encaminhados para o PS
de Cuiabá ou para o de
Várzea Grande.
Dois mundos, duas
histórias, dois finais. O
mundo em que reina as
OSSs seria quadro ideal
para o atendimento dos
cidadãos: hospitais
equipados, ambiente
propício para recuperação,
sem espera e com médicos
e outros profissionais à
disposição. Esse mundo
está distante do cidadão
comum e a barreira foi
criada pelo próprio Estado
de Mato Grosso.
O Pronto-Socorro
Municipal de Várzea
Grande realiza, em
média, 30 cirurgias
eletivas e ainda
atende todas as
emergências que
surgem. Se algum
acidentado mais
grave der entrada no
PS, ele só pode ser
encaminhado para o
Hospital
Metropolitano se
estiver ‘limpinho’,
denuncia Tetila. Ele
conta que os
acidentados ficam
internados no PS por
10, 20 dias tratando
de possíveis
infecções, tomando
antibióticos caros,
recebendo pré-
tratamento cirúrgico e
só depois são
encaminhados ao
Metropolitano. “A
gente faz todo o pré-
operatório do
paciente, gastamos
insumos e material,
aí o Metropolitano
opera e é ele quem
recebe a Autorização
de Internação
Hospitalar (AIH),
fornecida pelo SUS.
Lá, fica-se internado
no máximo cinco
dias. Isso é injusto!”,
lamenta o gestor.
O subsecretário é
um defensor ferrenho
do SUS: “O
atendimento
universalizado
deveria ser digno,
com corredores
limpos, atendimento
eficiente,
equipamentos de
última geração,
como os
comandantes do país
encontram nos
hospitais particulares
em que se tratam”. O
dirigente compara as
condições de
tratamento de um
tempo atrás, quando
havia mais valorização
da vida e menos do
patrimônio: “Hoje a
gente vê órgãos oficiais
com granito ou mármore
‘carrara’ e um pronto-
socorro com paredes
descascadas, sem
instrumentos
cirúrgicos, sem
material básico. A
valorização do
patrimônio está maior
que a valorização da
vida”, diz,
desgostoso.
metropolitana, com muitos
pacientes em condições
desumanas à espera de
cirurgias ou internações para
sanar os males. As cenas
deprimentes dos PS
contrastam com o saguão
com uma única pessoa que
estava à espera da
internação, com os
corredores limpos e vazios,
quartos com arrumação
perfeita, no Hospital
Metropolitano de Várzea
Grande, administrado pelo
Instituto Pernambucano de
Assistência à Saúde (Ipas),
uma das Organizações
Sociais (OSSs) contratada
pelo ex-secretário de saúde e
deputado federal Pedro
Henry (PP).
O contraste também
impera na distribuição dos
recursos: enquanto o Hospital
Metropolitano recebe do
Estado mais de R$ 2,2
milhões mensais, a verba do
PS de Várzea Grande é
próxima a RS 800 mil,
dividida em R$ 600 mil para
o pronto-socorro e R$ 200
mil para as Unidades de
Terapia Intensiva (UTI) e do
PS de Cuiabá, e o parco
recurso de R$ 1,4 milhão
para atender pacientes de
todo o Estado, sendo R$ 750
mil pelos 40 leitos de UTI.
A diferenciação também
é gritante na área de
atendimentos, como se
comprova com o número de
assistências médicas
prestadas. No Hospital
Metropolitano, a maior parte
das cirurgias é eletiva
[agendada] e de média ou
baixa complexidade como
cirurgia bariátrica, mas o
pagamento é alto: cerca de
três vezes a tabela do SUS.
Nos PS, toda a sorte de
atendimento deve ser feito,
independentemente da
complexidade e com tabela
‘seca’ do SUS.
“Aqui atendemos todas
as ocorrências: desde um
corte no dedo até
traumatizados por acidentes,
e não se pode escolher o que
e a quem atender. Se não
tem leito, até no chão temos
que colocar o paciente, pois
é nossa obrigação prestar o
atendimento”, relata Renato
Tápias Tetila, subsecretário de
Atenção Terciária de Saúde
de Várzea Grande.
Tetila conta que o
pronto-socorro está com
equipamentos muito velhos, o
que tem provocado, ainda
mais, queda na qualidade do
atendimento. “Nossa
autoclave tem 20 anos de uso
e acabou ficando avariada,
levando-nos a diminuir de 10
para 3 cirurgias por dia”,
conta o subsecretário que
ainda diz que “dois leitos da
Unidade de Terapia Intensiva
(UTI) estão fechados por falta
de respirador”.
Subsecretário de Saúde de Várzea Grande,
Renato Tetila, cobra atenção do governo estadual
Enquan t o o s p r on t o s - s o c o r r o s a t endem pe s s oa s no s
co r r edo r e s , no Me t r opo l i t ano é s ó ca lma r i a
Com equ i pamen t o s ob s o l e t o s e pouco s r e cu r s o s , o
PS de Vá r z ea Gr ande p r e s t a a t end imen t o p r e cá r i o
O s e c r e t á r i o Kami l Fa r e s d i z da s d i f i cu l dade s
pa r a a t end imen t o da popu l ação de t odo o e s t ado