CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 13 A 19 DE JUNHO DE 2013
POLÊMICA
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O governo federal já delegou a outros órgãos a missão de acompanhar a Funai no processo de demarcação.
Por: Diego Fredericci. Fotos: Reprodução
DEMARCAÇÃO INDÍGENA
Descentralizar para pacificar a causa
A Constituição prevê,
de fato, a defesa dos
interesses indígenas,
contudo, eles não são
proprietários dela,
podendo utilizá-la apenas
como usufruto. Essa é a
opinião de Felipe Reis,
Presidente da Comissão
de Estudos Constitucionais
da Ordem dos
Advogados do Brasil de
Mato Grosso (OAB-MT).
Segundo ele, há uma
inversão de valores e a
Funai não consegue suprir
as demandas dos povos
indígenas.
“A terra é da União e
não do índio. Este pode
fazer apenas usufruto
dela, isto é, um direito de
caráter temporário,
inalienável e
impenhorável, concedido
a outrem – no caso os
índios – para que ele
possa usufruir da coisa
alheia – do Estado. Penso
que a Funai não
consegue atender às
demandas dos povos
indígenas, na medida em
que há uma concentração
de poder em torno deste
órgão federal”, diz ele.
O membro da OAB
faz duras críticas à Funai
dizendo que uma
autarquia federal não
pode sobrepujar o
interesse público. Além
disso, culpou a falta de
reforma agrária pela
violência no campo, ao
lembrar que quando
forem feitas essas
discussões, os conflitos
pela terra devem diminuir
consideravelmente, não
Proposta
suspensão
das
demarcações
A posição da
CNA a respeito das
demarcações de terras
indígenas se define
pelo respeito às
decisões da Justiça,
em todas as suas
instâncias. Para a
solução dos conflitos,
defende a imediata
suspensão dos
processos de
demarcação em curso
até o julgamento pelo
Supremo Tribunal
Federal dos embargos
de declaração contra
a decisão em que
foram fixadas as
condicionantes no
caso Raposa Serra do
Sol.
Desta forma,
todos os Poderes
terão uma orientação
única sobre os
procedimentos de
ampliação ou criação
de terras indígenas.
Defende, ainda, a
revalidação da
Portaria AGU 303/
2012, com aplicação
obrigatória das 19
condicionantes do
caso Raposa Serra do
Sol, enquanto o STF
não julga os recursos
pendentes. Requer,
também, a
indenização não
apenas das
benfeitorias, mas
também das terras
legalmente tituladas
tomadas dos
produtores rurais.
Produtores: “Onde tem justiça
temespaço para todos”
A Confederação da
Agricultura e Pecuária do
Brasil (CNA) está mobilizando
os produtores rurais e suas
lideranças em todo o país
para participarem do ato
“Onde tem Justiça, tem
espaço para todos”, neste
dia 14 de junho. Em Cuiabá
a mobilização acontece das
9h às 14h na BR-364/163,
próximo ao posto da Polícia
Rodoviária Federal (PRF) da
capital sentido Rondonópolis.
A presidente da CNA,
senadora Kátia Abreu,
defende uma mobilização
“com firmeza e
determinação, mas de forma
pacífica, usando todos os
espaços que a democracia
nos proporciona”. Para ela, a
paz no campo “só virá com
segurança jurídica e respeito
ao direito de propriedade”.
“O que está em pauta
vai bem além de infrações
pontuais à lei. É o Estado
democrático de Direito que
está sendo contestado, de
dentro do próprio Estado”,
diz a presidente da CNA, que
vai além: “Os produtores
rurais não desrespeitam os
direitos dos índios, mas, ao
contrário, estão tendo os seus
desrespeitados”.
Segundo a senadora, as
invasões das propriedades
rurais por grupos indígenas
“têm sido sistemáticas, a partir
de ação da Fundação
Nacional do Índio (Funai),
que, ao arrepio da lei, decide
de maneira autocrática que
terras serão demarcadas,
ignorando os direitos do
produtor rural e a segurança
de sua família e
empregados”. Por esse
motivo, defende a construção
de uma nova política
indigenista, submetida não
apenas à Funai, mas
também a outros ministérios e
órgãos do governo federal.
“É inconcebível que uma
questão deste porte fique ao
arbítrio de um único órgão
aparelhado por uma
militância associada a
objetivos ideológicos e
comerciais, alheios ao
interesse nacional”.
Antropólogo relaciona conflitos
a desigualdades sociais
Os conflitos agrários
estão entre as maiores
causas de desigualdades
no país. De acordo com
Paulo Delgado, doutor
em Antropologia pela
Universidade Federal
Fluminense (UFF) e
supervisor do Museu
Rondon, da Universidade
Federal de Mato Grosso
(UFMT), 46% de toda a
terra disponível para
agricultura no país estão
concentrados em uma
parcela ínfima da
sociedade: apenas 1%
dos mais ricos controlam
esta grande faixa de
campo, em todo o
território. “Uma das
principais fomentadoras
de conflitos indígenas é a
questão fundiária. De
toda a faixa disponível
para agricultura, 46%,
quase a metade, está nas
mãos de 1% das elites
brasileiras, em nível
nacional. E a falta de
reconhecimento dessas
desigualdades, por parte
do poder público,
aumenta ainda mais as
tensões e os choques e
mortes que existem, na
luta por um pedaço de
terra”, diz ele.
O pesquisador,
especialista em cultura
indígena, falou que a
reforma agrária poderia
sanar muitos dos
problemas da violência
no campo. Citando o
caso recente sobre a
Terra Indígena
Marãiwatsédé, do povo
Xavante, no Nordeste do
Estado, relatou que
haveria um acordo entre
os posseiros, que
invadiram o espaço
destinado à etnia, para
que cada um deles
tivesse acesso a sua
propriedade num outro
local. Mas que interesses
políticos e econômicos
acabam sobrepujando
até mesmo a
Constituição.
“A Constituição de
1988 foi a primeira da
História a reconhecer o
direito à terra dos povos
indígenas. O que
infelizmente não vemos
nos meios de
comunicação é a notícia
exata e aprofundada.
Não se vê na televisão
que, entre os posseiros
que invadiram a terra
Marãiwatsédé, haviam
lideranças políticas e
econômicas importantes,
até mesmo
desembargadores,
desprezando a Carta
Magna”, afirmou.
apenas para os povos
indígenas, mas para todos
aqueles que lutam por sua
propriedade para
produzir.
“Os produtores
rurais pagam em média
40% de tributação pela
produção. Então, seus
direitos devem ser
observados. Além disso,
penso que a questão da
demarcação das terras
indígenas deva ser feita
não pela Funai, que é
uma autarquia federal, e
sim pelo próprio
Congresso Nacional,
representante legítimo do
povo brasileiro. É
preciso reformar o
Estatuto do Índio, que
tem quase 40 anos”,
pondera o jurista.
O lado dos
produtores rurais também
vê seus interesses
cerceados com as
demarcações de terras
indígenas. De acordo com
Alex Ushida, produtor de
milho e soja na região de
Campo Novo do Parecis
(444 km ao Norte de
Cuiabá), muitas questões
agrárias, como a falta de
segurança jurídica para
produtor, acabam
fazendo com que os
investimentos no setor
sejam minimizados.
“O que o produtor
precisa para trabalhar é a
segurança jurídica, que é
benéfica tanto para o
agricultor quanto para os
povos indígenas. Costuma
haver uma convivência
pacífica entre os
produtores e os donos da
terra, mas quando ocorre
a demarcação, os
conflitos e a violência
aparecem. Em minha
opinião, é necessário uma
reformulação das políticas
públicas que envolvam
essas demarcações”, diz
ele.
Afirmando existir um
diálogo entre os
produtores da região de
Campo Novo e as etnias
indígenas, Alex defende
uma nova legislação,
dizendo que os
empresários do ramo não
buscam o conflito, e sim
conviver pacificamente
com os povos nativos,
além de pontuar que as
demarcações não devem
ficar centralizadas.
“Acho que a
descentralização da
demarcação da terra
indígena é um dos
caminhos para
diminuirmos a violência.
Nós produtores não
queremos o conflito e sim
a integração. Algo que
nos preocupa é que, ao
investirmos em terras,
nunca sabemos se
determinado pedaço de
chão é propriedade nativa
ou não. Entretanto,
buscamos sempre a
pacificação”, sintetiza ele.
Av i s o de t e r r a p r o t eg i da , de s t i nada ao s po v o s i nd í gena s , dema r c ada pe l a Funda ç ão Na c i ona l do Í nd i o ( Funa i ) .
So l dado s da Fo r ç a Na c i ona l , na g l eba i nd í ge na Su i á -Mi s s ú
S e nado r a Ká t i a Ab r e u ( P SD -TO)