CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 6 A 12 DE JUNHO DE 2013
POLÍTICA
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ALERTA NA COPA
Especialista alerta que uma contratação integrada abre brecha para desvios de verbas públicas se não houver rigor na fiscalização.
Por: Rita Anibal. Foto: Pedro Alves
“Brecha legal” para favorecimentos
O Regime Diferenciado
de Contratação (RDC),
regulamentado em outubro
de 2011 pela Lei nº
12.462, foi criado para dar
maior celeridade na
contratação de empresas
especializadas na execução
de obras de infraestrutura
da Copa do Mundo de
2014 e Olimpíadas de
2016. Em uma de suas
nuances, dá poderes quase
que supremos aos
governadores. É ele,
governador, quem decide
“o que e onde comprar
obras de infraestrutura em
benefício da população”,
diz a lei. O poder legado
ao governador do Estado,
no entanto, pode levar “a
conluios e cartas marcadas”
na contratação das obras,
na análise do procurador
geral da República, Roberto
Gurgel, que já fez duras
críticas à aprovação da lei.
Em Cuiabá, uma das
sedes da Copa do Mundo
de 2014, o órgão
responsável pelas obras do
evento é a Secretaria
Extraordinária da Copa
(Secopa), subordinada
diretamente ao governador
Silval Barbosa, e que
homologou esta semana o
Consórcio C.L.E. Arena
Pantanal, constituído pelas
empresas Canal Livre
Comércio e Serviços Ltda e
Etel Engenharia, Montagens
e Automações Ltda, como
o vencedor do Edital Nº 5/
2013, cujo objeto é a
aquisição do sistema de
Tecnologia da Informação
(TI), som e iluminação por
R$98,3 milhões.
Nesse tipo de
contratação, qualidade e
eficiência serão uma
incógnita, pois o projeto
PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE RDC E A LEI DAS LICITAÇÕES
ORÇAMENTO SIGILOSO-No RDC, o valor do contrato estimado pelo governo
não é revelado aos interessados na concorrência, enquanto na Lei das Licitações a
divulgação desse preço de referência é uma informação básica e obrigatória do
certame.
INVERSÃO DE FASES-Na concorrência pelo RDC, a habilidade técnica e o plano
de negócios da empresa são analisados após ela ser declarada vencedora, por
oferecer o menor preço para a execução do empreendimento. Na Lei das
Licitações, todos os concorrentes têm suas habilitações analisadas previamente para
só depois ser escolhida a melhor proposta.
CONTRATAÇÃO INTEGRAL-Pelo RDC, o governo pode fazer a contratação
integrada da obra e de seus estudos com o mesmo fornecedor que fica responsável
pela elaboração dos projetos básico e executivo de engenharia. Pela Lei 8.666, é
proibido fazer a licitação de um empreendimento sem a elaboração prévia do
projeto básico.
REMUNERAÇÃO VARIÁVEL-Um contrato de RDC pode permitir que a empresa
escolhida receba bônus de acordo com o seu desempenho e metas estabelecidas,
enquanto que a Lei 8.666 não prevê esse tipo de flexibilização.
ESCOLHA DA PROPOSTA-Se o vencedor de uma concorrência por RDC desistir
do contrato, o governo pode acatar a segunda melhor oferta, enquanto que na Lei
das Licitações o segundo colocado só é escolhido se concordar em acatar as
condições financeiras feitas pelo primeiro colocado.
Fonte: Fernando Nogueira da Costa
FIQUE POR DENTRO
O QUE É RDC: uma nova modalidade de
licitação, o Regime Diferenciado de Contratações –
RDC, instituído pelo governo federal a fim de
ampliar a eficiência nas contratações públicas e
competitividade, promover a troca de experiências
e tecnologia e incentivar a inovação tecnológica. É
aplicável exclusivamente às licitações e contratos
necessários à realização dos Jogos Olímpicos e
Paraolímpicos de 2016; da Copa das
Confederações da Federação Internacional de
Futebol Associação - Fifa 2013; da Copa do
Mundo Fifa 2014; de obras de infraestrutura e de
contratação de serviços para os aeroportos das
capitais dos Estados da Federação distantes até
350 km das cidades-sede dos mundiais; e das
ações integrantes do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC). Por meio da Lei nº 12.722, de
3 de outubro de 2012, o governo federal estendeu
o uso do RDC para as licitações e contratos
necessários à realização de obras e serviços de
engenharia no âmbito dos sistemas públicos de
ensino.
O QUE É A LEI DE LICITAÇÕES: A Lei
8.666 estabelece normas gerais sobre licitações e
contratos administrativos pertinentes a obras,
serviços, inclusive de publicidade, compras,
alienações e locações no âmbito dos poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios. É composta de diversos procedimentos
que têm como meta princípios constitucionais como
a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a
publicidade e a eficiência, com o intuito de
proporcionar à administração a aquisição, a venda
ou uma prestação de serviço de forma vantajosa,
ou seja, menos onerosa e com a melhor qualidade
possível.
Governo aponta vantagens do RDC
O Governo do Estado
contabiliza vantagens na
contratação pelo Regime
Diferenciado de
Contratação, o pouco
conhecido RDC. Uma delas
seria que pelo RDC a
administração pública
primeiro avalia as propostas
técnicas e de preço
conforme critérios
estabelecidos no edital e
realiza a sessão de
habilitação apenas com a
empresa mais bem
RDC é o pior exemplo
que existe, diz especialista
Maurício Zockun,
advogado, professor de
Direito Administrativo na
Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo
(PUC-SP), mestre em Direito
Tributário e doutor em
Direito Administrativo pela
PUC-SP, também em
entrevista exclusiva ao
Circuito Mato Grosso,
diz que “por si só, o sistema
RDC de contratação, em
questões jurídicas, é o pior
exemplo que existe”.
Zockun fala que “num
primeiro momento você
acha maravilhoso. Depois
vê que quem custeia é o
contribuinte porque a
empresa vencedora com
menor preço é quem ditará
o que fazer e como fazer
com muito pouca ou
nenhuma fiscalização por
parte do Estado”.
O advogado lembra
pontuada nos quesitos
técnica e preço.
Somente após a
declaração definitiva da
empresa vencedora, é que é
aberta a fase recursal,
oportunidade na qual as
licitantes podem fazer
questionamentos sobre o
processo licitatório, desde
que tenham manifestado
intenção de recorrer ao
término de cada sessão do
certame.
Outra vantagem citada
pelo governo é a fase
‘negocial’ que o ocorre antes
da assinatura do contrato,
possibilitando a elaboração
de um consenso com a
licitante para reduzir o valor
da proposta vencedora.
A restrição de aditivos é
também um fator positivo no
Regime Diferenciado de
Contratação. Como o
vencedor da licitação é
responsável pelo projeto e
execução das obras, a
proibição de aditivos
contribuiria para que as
empresas façam projetos
com mais qualidade. A lei
permite a celebração de
termos aditivos apenas nas
seguintes hipóteses: por
necessidade de alteração do
projeto ou das
especificações técnicas,
desde que não sejam
decorrentes de erros ou
omissões por parte do
contrato; e em decorrência
de caso fortuito ou força
maior.
que estão tratando de
formas distintas o mesmo
objeto: “São dois pesos e
duas medidas”. Explica
Zockun que, se alguém for
fazer um estádio de futebol,
“aquele que servirá à Copa
do Mundo ou às
Olimpíadas, terá tratamento
diferenciado juridicamente”
(veja quadro ao lado).
Tudo porque o RDC
funciona “como uma venda
casada: o contratado
elabora e executa o projeto
e essa não é a melhor
solução para a tutela do
bem público”.
Zockun destaca que
“ao impedir julgamento
objetivo da licitação do
projeto básico e do projeto
executivo, uma contratação
integrada abre brecha para
crimes e poderá ensejar
graves desvios de verbas
públicas”.
básico e a execução são
feitos pela própria empresa
escolhida, contrariando a
Lei das Licitações nº 8.666,
que exige que uma empresa
elabore e outra execute,
assim, ambas se fiscalizam.
O mesmo RDC,
provavelmente, também
regerá a aquisição dos
assentos para a Arena
Pantanal.
O poder do RDC é
tamanho que, neste caso do
Edital nº 5/2013, foi o
próprio Governo – através
da Secopa – que julgou
improcedente a
impugnação do consórcio
Tnl Pcs S/A - Oi, que
protocolou 24
questionamentos, todos
julgados improcedentes
pela secretaria.
Numa das questões da
Tnl Pcs S/A - Oi sobre a
idoneidade do consórcio
vencedor, a Secopa
responde que “a
impugnação é tempestiva”
quanto à alegação de que
a penalidade incluindo
impedimento de contratar
com a administração
pública em geral –
inobservância do art. 47 da
Lei n.º 12.46212011 e do
artigo 87, inciso III da Lei n.º
8.6661/93.
A alegação é
improcedente
, pois tal
disposição é ato de
probidade administrativa e
dever do agente manter
afastadas de certames
públicos concorrentes que
tenham sido declaradas
inidôneas para licitar com a
administração pública de
qualquer esfera. Permitir sua
participação é pôr em risco
o interesse público e toda a
contratação”. A resposta do
órgão governamental
exprime dualidade, pois a
contratação foi feita pelo
RDC, mas o argumento
para a improcedência foi
baseado na Lei das
Licitações.
Dra. Denise Vinci Tulio,
coordenadora da 5ª
Câmara do Ministério
Público Federal, falando
com exclusividade ao
Circuito Mato Grosso
,
sintetiza a irrazoabilidade
do RDC: “O principal
problema é a falta de
projeto básico. O governo
não sabe o que está sendo
licitado. Por mais que se
descreva sumariamente o
objeto, as dificuldades de
mensurar o que está sendo
executado é muito difícil”.
Ela vai além: “Sem o
projeto básico, não tem
como controlar se a
execução corresponde ao
que foi licitado; o controle
é deficitário. Aí pode
acontecer o lesa-
patrimônio, pois não se têm
parâmetros para a
fiscalização”.
A coordenadora
lembra ainda que o
procurador geral da
República, Roberto Gurgel,
entrou com uma Ação
Direta de
Inconstitucionalidade (ADI)
que está sendo apreciada
pelo Supremo Tribunal
Federal (STF).
Con t r a t açõe s pe l o RDC, que e s t á s ob a r e s pon s ab i l i dade
da S e copa , d i s pen s am p r o j e t o bá s i co
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