CIRCUITOMATOGROSSO
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CUIABÁ, 9 A 15 DE MAIO DE 2013
Queda da carga tributária gerou déficit
MARCEL DE CURSI
Secretário, que vem sendo bombardeado por deputados e secretários, diz que contenção de gastos é inevitável.
Por: Débora Siqueira. Foto: Pedro Alves
Administrando com
mão de ferro as finanças
do Estado, o secretário de
Fazenda, Marcel de Cursi,
em entrevista exclusiva ao
Circuito Mato Grosso,
reconhece os riscos
apontados pelo Tribunal
de Contas do Estado
(TCE) de o déficit chegar
à casa dos R$5 bilhões
em 2014 caso não seja
mantido o rigor no
controle dos gastos. Ele
diz que o governo Silval
Barbosa herdou o déficit e
que a grande quantidade
de “fundos” acabou
onerando o Tesouro.
Confira a íntegra da
entrevista:
Circuito Mato
Grosso - Secretário,
por que o Estado está
gastando mais do que
arrecada, como mostra
relatório do TCE?
o
DE CURSI - Há um
déficit recorrente desde
2009. Os déficits são
decorrência de uma
trajetória de queda da
carga tributária, haja vista
que neste período o
Estado reduziu a carga
para inúmeros itens,
dentre os quais
destacamos energia
elétrica, telefonia, álcool,
comércio, empresas do
Simples com metade da
carga nacional na
aquisição interestadual.
Ou seja, a política
tributária seguiu o
caminho da redução de
tributos, descendo 30% a
carga tributária, reduzida
de 11,5% do PIB em 2004
para próximo de 9% do
PIB MT em 2011. Neste
período, acumularam-se,
ainda, frustrações de
receitas federais
suprimidas pela União
mediante estímulo federal
à atividade econômica
nacional e crises
econômicas. Ainda nesta
época, a política do gasto
aumentou a infraestrutura
pública, gerando
despesas de caráter
continuado. Também, em
Mato Grosso, o Executivo
tem pouco recurso, hoje
ele fica com 86,2% do
orçamento, sendo que a
média nacional é o Poder
Executivo ter 91% do
orçamento. Esta pequena
diferença de 4,8%
significa R$450 milhões
que estariam dentro do
Executivo e cobririam o
referido déficit. Quanto à
trajetória do déficit, ele foi
formado pela trajetória
crescente de infraestrutura,
crescimento da folha de
pessoal, redução da
participação do Executivo
no orçamento, política de
redução de carga
tributária e crise
econômica mundial.
CMT - Conforme o
TCE, o Estado precisa
rever a evolução das
despesas quando
comparadas com as
receitas, pois, nesse
ritmo, ao final de
2014, o Estado
apresentará um déficit
de mais de R$5
bilhões. O que está
sendo feito para
estancar o aumento
das despesas?
DE CURSI - A partir
de julho
de 2012,
o
governador
Silval
Barbosa
determinou
a
intensificação
de
medidas.
Esta
intensificação
no
segundo
semestre
tomou a
forma de forte contenção
dos gastos mediante
restrições à capacidade de
empenho, liquidação e
pagamento. Isso rompeu
com o ciclo de déficit
crônico desde 2009 e
resultou em superávit
orçamentário de R$190
milhões, ou seja, depois
de três déficits
consecutivos, obtivemos
um superávit
orçamentário. Esta
mudança foi muito
importante e representa
uma contenção das
despesas, sem no entanto
restringir ou contingenciar
programas sociais e as
secretarias de Saúde,
Educação, Secopa,
Segurança, Justiça e
Cultura, bem como o
Indea e a Empaer. Já
tomamos, assim, as
medidas, a partir de julho
de 2012, havendo
necessidade de mantê-las,
no mínimo, até o final
deste ano.
CMT - Foi devido
a esse quadro que
houve a necessidade
de um controle mais
rigoroso e a
concen t ração de
fundos e do orçamento
na Conta Única?
DE CURSI - As
distorções das finanças
foram herdadas pelo
governador Silval
Barbosa, ou seja, já em
2004 foram fechadas
mediante a Lei
complementar Estadual nº
199/2004. Portanto,
desde esta época uma
distorção estava afetando
as finanças. Esta distorção
consiste no excesso de
fundos, ou seja, vão se
retirando recursos do
Tesouro, diminuindo o
caixa central e destacando
receitas dele para entregar
para um fundo. Este fundo
passa então a gastar as
receitas originalmente
pertencentes ao Tesouro,
sem levar consigo as
despesas que o Tesouro
pagava com as mesmas.
Desta forma, ano após
ano, fundo após fundo, o
Tesouro acabou ficando
com todas as despesas e
menos de 30% das
receitas totais. Isto mesmo:
ficou com 100% das
despesas preexistentes e
menos 70% das receitas
preexistentes. A situação se
agravou com o tempo,
pois em alguns casos o
fundo ficou deficitário e o
Tesouro passou a suportar
o déficit do mesmo. Por
isso a necessidade de
buscar de volta as receitas
dos fundos. O controle
rigoroso se explica porque
não há sobras, não há
gorduras, bem como pelo
fato de a Assembleia
Legislativa ter aprovado
em 2012 lei limitando o
uso dos fundos em 30%
da receita do mesmo e
determinado aos fundos
que paguem as suas
despesas,
ou seja, se
equilibrem
para não
gerar déficit
ao Tesouro.
Neste
momento
estamos
implantando
esta nova
ordem
financeira.
Penso que
por isso há
tanta
estranheza,
pois assim como o
Tesouro não pode usar
mais de 30%, todos
tiveram de alguma forma
de corrigir déficits.
CMT - Quanto tem
sobrado anua lmen t e
para investimentos no
Estado, de recursos
p r óp r i os ?
DE CURSI - A cada
investimento feito, mais
recursos próprios são
demandados. Explico: o
dinheiro do Fethab, uma
vez utilizado nos últimos
anos para pavimentar três
mil quilômetros de
rodovias, agora precisa
ser utilizado para dupla
finalidade: manter os
próprios três mil
quilômetros e ainda
pavimentar mais
quilômetros. Evidente que
ocorre um ponto de
inflexão, ou seja, haverá
um momento em que o
Fethab vai alcançar seu
esgotamento, pois à
medida que
pavimentamos também
criamos a respectiva
manutenção. Neste
sentido, para um Estado
em que 30% da economia
está diretamente
desonerada por ser de
exportação e outros 30%
estão indiretamente
desonerados por estarem
ligados a atividade de
exportação, temos que a
base tributária do Estado
é menos da metade da
economia, no entanto a
economia toda demanda
recursos. Aqueles que
estão desonerados
também demandam
infraestrutura, escolas,
saúde e educação, e isso
gera uma limitação
crônica para Mato
Grosso. Estamos em um
momento crucial e a
redução de gastos precisa
ser geral, de forma tal que
aumente a participação
do Poder Executivo no
orçamento. Neste
momento, é inevitável
utilizar operações de
crédito, pois o Executivo
está suportando sozinho a
Copa de 2014, tendo
ainda que assegurar aos
demais Poderes a
transferência de recursos
como se a Copa
inexistisse, ao mesmo
tempo em que é
mensalmente cobrado de
eventuais diferenças,
ainda que sejam elas
pequenas.
CMT – Em 2006 ,
a ca r ga t r i bu t á r i a
e s t adua l r e p r e s e n t a v a
9 , 94% do P I B , mas
em 2011 a r e l ação
f i cou a i nda meno r ,
pa r a 8 , 84%. O
s enho r acha que e s s e
é um i nd i ca t i vo de
que o gov e r no
e s t adua l p r e c i s a r e v e r
a po l í t i ca t r i bu t á r i a e
a con t en ção do s
ga s t o s púb l i co s ?
DE CURSI - É
verdade que houve
efetiva redução de carga
tributária. A sociedade
pediu e defendeu isso e
até elegeu governantes
para isso. O problema é
que existe um custo
público médio para
governos subnacionais,
ou seja, um governo
subnacional com receitas
abaixo de 10% do PIB
local tem dificuldades
para se manter. O
Executivo tem buscado
resolver este problema,
primeiro focando na
eficiência tributária de
padrões internacionais,
próxima de 88%, ou
seja, de cada 1 real de
potencial se arrecadam
88 centavos. Será
preciso, em algum
momento, enfrentar a
questão do ajuste ou
não desta carga
tributária, avaliando se
ela deve ou não pelo
menos retornar ao nível
de 2006 ou decidir quais
cortes faremos nos
orçamentos e despesas
de todos. Neste
momento, o ajuste fiscal
e a execução da Copa
do Mundo estão sendo
realizados integralmente
concentrados no Poder
Executivo, que está
suportando sozinho
todas as suas
consequências. O Estado
efetivamente reduziu a
carga para inúmeros
itens. Ou seja, a política
tributária seguiu o
caminho da redução de
tributos. E a recuperação
da carga tributária aos
níveis de 2006
significaria dobrar a
capacidade atual de
investimento com
recursos próprios, pois
não é coerente termos
uma sociedade rica e um
Estado pobre ou vice-
versa.
“O controle
rigoroso se
explica porque
não há sobras,
não há gorduras”