POLÍTICA
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CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 30 DE NOVEMBRO A 6 DE DEZEMBRO 2017
direito de ir e vir. Esse é o
foco da disputa entre um gru-
po de moradores, cansados da
violência, a Ordem Pública
de Cuiabá, o Juizado Volan-
te Ambiental e o Ministério
Público Estadual de Mato Grosso. Desde no-
vembro, o poder público passou a multar os
proprietários das casas que construíram ver-
dadeiras barricadas caseiras na capital.
Esta semana um projeto de lei pode mudar
essa realidade. O PL foi lido nesta terça-fei-
ra, 28, e deve ser votado dia 4 de dezembro.
Ele é fruto de uma comissão composta pelos
vereadores Luís Cláudio (PP), Adevair Ca-
bral (PSDB), Dilemário Alencar (PROS) e
Dodo Veggi (PRP) e mais representantes da
comunidade: Alfonso Leite, síndico do Con-
domínio Solar da Chapada; José Ribeiro da S.
Nunes, morador do bairro Jardim Califórnia,
e o assessor parlamentar Tadeu Cesário.
Os vereadores afirmam que podem apro-
var a proposta por unanimidade. Todos os 25
vereadores da Casa assinaram o PL que deve
ser apresentado ainda este ano para o prefeito
Emanuel Pinheiro (PMDB).
“É uma vontade da população, entende-
mos que a rua é um direito de todos, mas não
podemos ignorar o direito de as famílias te-
rem maior segurança. Por isso a lei vai esta-
belecer critérios e princípios para que a pre-
feitura possa conceder a autorização para o
fechamento, da forma semelhante ao que já
acontece em cidades como Rio de Janeiro e
São Paulo”, afirmou o vereador Luís Cláudio.
O fechamento das ruas ocorre das mais
diversas formas. Alguns moradores instalam
grades e portões e existem casos nos quais até
são construídas guaritas em bairros de com
mais famílias. A violência é a principal justi-
ficativa para a prática.
Em Cuiabá já existem vários casos de fe-
chamento de rua. Os bairros onde a prática
é mais frequente são: Jardim Itália, Cidade
Alta, Morada do Ouro, Jardim das Améri-
cas, Bom Clima, Terra Nova, Sesmaria São
José, Avenida Beira Rio e Rua Prof. Alfredo
Monteiro.
“Eu adoraria morar em uma casa como
nos Estados Unidos, sem cerca, porém, não é
essa a realidade que vivemos em Mato Gros-
so. Quando me mudei para o bairro Santa
CAPA
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O
É PROIBIDO
Falta de segurança leva moradores
Moradores cansados da violência em Cuiabá decidem instalar condomínios amadores e
Por Karollen Nadeska e Juliana Arini
Cruz (em Cuiabá), há três anos, eram muitos
assaltos. A maioria dos moradores que chega-
va com o carro em casa era parada por ladrões
na porta de casa. Foi aí que nos unimos e de-
cidimos instalar a grade com o portão na en-
trada da rua, que é sem saída”, conta Jackson
Garcia, um dos moradores autuados a retirar
o portão de uma rua sem saída, na região do
Coxipó, em Cuiabá. “Além de o portão re-
duzir os assaltos, ou melhor, acabou mesmo,
começamos a cuidar de um terreno que tem lá
no fundo da rua e que ainda é limpo. Antes,
todo mundo vinha com o caminhão e joga-
va entulho, de madrugada, lá. Com o portão
acabou isso. Limpamos o terreno e ali está
limpo, virou uma área de preservação”, diz.
Cuiabá é a 39ª cidade mais violenta do
mundo, segundo levantamento realizado
pela ONG Mexicana Conselho Cidadão para
Segurança Pública e Justiça Penal. Essa re-
alidade se confirma no dia a dia do cidadão
mato-grossense que tem tomado medidas
emergenciais e no “desespero” tenta conter o
perigo vivenciado nas ruas da capital.
“Nós vivemos em um bairro simples, mas
fomos obrigados a construir as guaritas por
segurança. Eu vejo o promotor falar em di-
reito de ir e vir, mas fico pensando: até onde
existe o direito de ir e vir de um indivíduo que
vem até aqui para fazer o mal? Para assaltar a
casa de outra pessoa ou fazer coisa pior. Isso
existe quando eu me torno uma ameaça para
a comunidade?”, questiona José Ribeiro, do
Solar da Chapada.
Jackson e José Ribeiro são representantes
de moradores de bairros que também parti-
ciparam de uma reunião no Conselho Regio-
nal de Corretores de Imóveis de Mato Grosso
(Creci-MT), na sexta-feira passada (24/11). O
auditório lotado contou com a participação de
cidadãos dos mais diversos bairros de Cuia-
bá, representantes da Prefeitura Municipal,
corretores e vereadores. Todos eram unâni-
mes quanto à necessidade de se construir por-
tões nas ruas para reduzir os roubos e furtos.
A violência constante também pesou no
bolso dos moradores. Em alguns bairros a
desvalorização por conta da insegurança de
se viver em uma casa causou a perda de até
50% do valor dos imóveis. O Santa Rosa, o
Jardim Cuiabá, o Shangri-lá e o Boa Esperan-
ça são alguns exemplos de regiões que sofre-
ram uma forte desvalorização.
A ideia de que essas regiões proporcionam
uma boa qualidade de vida ficou na lembran-
ça. “Os bons bairros do passado fica-
ram na nostalgia do cuiabano. Es-
pero sinceramente que o MPE
e as autoridades tenham bom
senso. Se permitirem a ins-
talação desses portões de
proteção em alguma ruas,
como as sem saída, po-
deremos ao menos salvar
algumas áreas residenciais
na cidade”, explica o dire-
tor-secretário do Creci-MT
Claudecir Contreira
.
A desvalorização e a violência
começaram a ser percebidas na capital a
partir do ano 2000. Foi o crescimento
desordenado da cidade e, sobretudo,
o avanço da violência que fizeram
as pessoas começarem a migrar
das casas para apartamentos
e condomínios fechados. Se-
gundo o Creci, o processo fez
com que as pessoas rapidamen-
te perdessem o interesse em se
arriscar em morar em uma casa.
“A diferença de preço entre
um apartamento e uma casa em um
mesmo bairro de Cuiabá chega a ser
ertificada desse pro-
blema de moradia
e segurança, a
Secretaria de
Ordem Públi-
ca de Cuiabá esclare-
ceu em quais casos
ex i s te autor i zação
para se agir quanto a
essa prática que já está
se tornando corriqueira.
De acordo com o se-
cretário
Leovaldo Salles
,
que também é coronel re-
formado da Polícia Militar, a pasta
C
Ordem Pública fala sObre ações e determinações Para “derrubada” dOs murOs
recebe uma forte demanda desses
tipos de casos, no entanto, as
equipes só podem ser acio-
nadas após o recebimento
de ordem judicial.
“Nós somos submissos
à lei, então não podemos
fechar nenhuma rua em
Cuiabá. Todas as vezes que
nós temos conhecimento,
fazemos a fiscalização e
solicitamos a demolição. Tam-
bém há vezes em que recebe-
mos, do próprio Ministério Público,
o pedido para derrubada”, explica.
Questionado sobre a segurança,
Salles pontua que não é de obrigação
do setor de Ordem Municipal garantir
esse trabalho e que cabe ao Estado
assumi-lo, como prevê a lei.
“A Secretaria de Ordem Pública não
faz a Segurança Pública. Ela é inerente
por força de Constituição e é responsa-
bilidade do Estado fazer a segurança.
São conceitos completamente diversos.
A Polícia Militar faz Segurança Pública
e essa [fechamento de vias] é uma
demanda do Estado”, exemplifica, no
sentido de distinguir o papel de cada
secretaria.
Secretaria de Segurança Pública
do Estado (Sesp-MT) enviou uma
nota ao jornal para esclarecer que
não há falta de rondas nos bairros
A
secretaria de segurança Pú
promotor deJustiça
Gerson
Natalício Barbosa
,
da P romo t o r i a
da Defesa da
Ordem Urbanística e do
Patrimônio Cultural,
confirmou à reportagem
que foi procurado pela
Câmara Municipal para
opinar e orientar o
projeto de lei, mas ele
não vê ainda legalidade na
proposta.
“Eu fui procurado por ve-
readores e pude perceber que eles
estão bastante ponderados. O interesse
deles é com relação àqueles casos de
condomínios fechados há 20 e 30 anos.
A lei diz que vale também para essas
situações, mas muitas já estão ajuiza-
das em ação civil pública no Ministério
Público Estadual, o que complica ainda
mais a situação. No entanto, o Ministé-
rio Público está aberto para discutir e
entender melhor o problema”, afirmou
o promotor.
Conforme o promotor, a proposta
não pode ser considerada uma prio-
ridade do ponto de visa de que o
interesse parte apenas de um grupo
minoritário.
“Eu vejo a restrição legal porque
as ruas são de uso comum do povo.
Salvo o interesse público, ele tem de
O
PrOmOtOr diz nãO cOncOrd
ANDREA LOBO
AHMAD JARRAH