CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ,
20 A 26 DE FEVEREIRO
DE 2014
POLÍTICA
P
G
7
ESTRADAS
Abandono, prejuízo e vítimas fatais
Maior produtor de grãos do país sofre não apenas com a falta de opções de escoamento da safra mas também com a qualidade das vias disponíveis
Diego Frederici
Com previsão de
193,9 milhões de
toneladas, a safra de
2014 promete atingir um
novo recorde, com uma
produção 3% maior em
relação a 2013, segundo o
Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística
(IBGE). Mato Grosso, o
maior Estado produtor de
grãos do país,
respondendo por 29,1%
desse volume, poderia
facilmente ultrapassar os
níveis atuais de sua
liderança no campo não
fosse a dependência
quase exclusiva de uma
única opção de
escoamento de produtos:
as rodovias.
Recentemente
“negociada” com um
grupo de empresas
privadas, por meio do
regime de concessão, a
BR-163 é exemplo da
importância e do
sobrecarga das rodovias
que cruzam Mato Grosso.
Colocada em leilão no dia
27 de novembro de 2013,
o trecho mato-grossense
da rodovia conta com
mais 850 km e liga
importantes centros
agrícolas do Estado:
Rondonópolis, Lucas do
“Se depender de mim, vou continuar terceirizando as estradas”, diz Silval
Mato Grosso
possui dimensões
continentais. Com
quase 907.000
quilômetros
quadrados, a unidade
federativa conta com
uma malha rodoviária
de 4,9 mil km de
rodovias federais,
30.000 km de
rodovias estaduais e
mais de 60.000 km de
rodovias municipais.
Segundo o
governador Silval
Barbosa (PMDB-MT),
o Estado não possui
condições de fazer
manutenção e prover boas
condições de tráfego
nesses locais sem ajuda
da iniciativa privada, e
que, por isso, pretende
“terceirizar todas as
estradas que podem ser
terceirizadas”.
Entre as rodovias que
devem ser entregues à
concessão privada estão a
MT-251, no trecho que
compreende três
municípios: Cuiabá,
Chapada dos Guimarães e
Campo Verde. Ao todos,
estão previstos que pouco
mais de 148 km sejam
licitados. A iniciativa, no
entanto, sofre pressão de
alguns setores da
sociedade, que afirmam
que uma rodovia que liga
cidades turísticas não
deve ser onerosa aos
usuários.
Outro sistema viário
que deve passar a
empresas particulares é a
MT-130, entre as
cidades de Primavera do
Leste e Paranatinga.
Nela, estão previstas três
praças de pedágio. As
rodovias MT-246, MT-
343, MT-358 e MT-
249 também entram
no rol das concessões
que o Governo do
Estado pretende
realizar.
Para Silval, a
política de concessões
de estradas está
definida. “É uma
decisão que tomamos
e, agora, vamos
colocar em prática.
Fizemos isso após
muito estudo.
Portanto, trata-se de
um caminho sem
volta”.
Agronegócio perde R$ 3
bilhões em três anos
A concessão à
iniciativa privada das
principais rodovias de
escoamento de grãos do
Centro-Oeste está longe
de dar sossego aos
agricultores. Como as
obras de ampliação das
estradas vão demorar, a
produção que está sendo
colhida enfrentará os
mesmos gargalos que
reduziram os ganhos em
anos anteriores. Nos
últimos três anos, de
acordo com o diretor
executivo do Movimento
Pró-Logística, Edeon Vaz
Ferreira, o setor teve
despesas de R$ 3 bilhões
devido à infraestrutura
precária.
O setor espera obter
este ano a maior safra de
soja da história no
Centro-Oeste: 90,3
milhões de toneladas.
Porém já contabiliza
prejuízos de R$ 900
milhões no escoamento da
commodity por falta de
logística adequada,
segundo o
Correio
Braziliense
.
Segundo o
Movimento Pró-Logística,
as BRs 163, 364, 070 e
158, principais rodovias
de escoamento do Centro-
Oeste, estão com
movimento 300% acima
da capacidade por falta de
manutenção. Para Edeon
Ferreira, se boa parte da
produção fosse exportada
pelo norte do país, e não
pelo sul, o tempo gasto
seria menor e os
pedágios, mais baratos.
Além disso, “se o governo
federal investisse mais em
ferrovias e hidrovias, as
transportadoras cobrariam
menos”.
Trafegar em sistemas
viários que não apresentam
condições satisfatórias de
uso impacta nos custos
dos produtos
comercializados, no tempo
de viagem e na manutenção
e consumo de
combustíveis dos veículos.
Um estudo da Comissão
Econômica para América
Latina e Caribe (Cepal)
mostra que rodovias em
condições precárias
aumentam em 45% o custo
operacional dos veículos,
duplicam a duração da
viagem e podem aumentar
o consumo de combustível
em até 60%.
A dura realidade de
estradas com manutenção
insuficiente é conhecida
em Mato Grosso, um
Estado que possui alta
demanda logística, mas
uma baixa oferta de opções
de transporte – sobretudo
aos produtores agrícolas.
Filas que se estendem por
vários quilômetros,
buracos, falta de
Rodovias precárias
oneram transporte
sinalização e excesso de
caminhões são comuns na
BR-364, a maior rodovia
diagonal do Brasil, que liga
o Estado de São Paulo ao
Acre, passando por Minas
Gerais, Goiás, Mato
Grosso e Rondônia.
Em dezembro de 2013
um grave acidente
envolvendo um bitrem, três
caminhões e um automóvel
Palio matou sete pessoas
da mesma família no
trecho da via que atende
Várzea Grande, na região
metropolitana de Cuiabá.
Na noite do dia 14 de
fevereiro, Luiz Martelli,
diretor da Martelli
Transportes, morreu num
acidente na BR-242, no
município de Nova Ubiratã
(394 km de Cuiabá).
Segundo informações, o
empresário dirigia uma
Land Rover prata e caiu de
uma ponte de madeira sem
proteção lateral.
Más condições, no
entanto, não são
exclusividade das rodovias
federais. Trecho da MT-
220, que liga Sinop a Juara
(664 km de Cuiabá) corre
risco de ceder devido à
erosão. Próximo à falha há
um lago que beira a
estrada, o que pode
acelerar o processo de
deterioração.
Os produtores também
sofrem as consequências
desse descaso. Antônio
Carlos de Souza, criador e
diretor Associação Mato-
grossense dos Criadores de
Ovinos e Caprinos
(Ovinomat), aponta as
consequências de um
sistema viário inseguro:
“No caso dos criadores,
além dos danos que podem
acometer os animais, os
veículos dificilmente saem
ilesos”.
O outro lado – O
secretário de Estado de
Transporte e Pavimentação
Urbana, Cinésio Oliveira,
declarou esta semana que a
recuperação das estradas e
pontes somente ocorrerão
após o período chuvoso.
Rio Verde, Sorriso e
outros.
A nova realidade da
rodovia sugerida pela
concessão, no entanto,
pode estar distante das
demandas atuais dos
produtores e dos
motoristas comuns, tendo
em vista que a assinatura
do contrato com a
Odebrecht, empresa que
venceu o certame, já foi
adiada uma vez. A atual
previsão é que ele seja
oficializado no próximo
dia 20 de fevereiro. A
necessidade de um
sistema viário seguro e
mais eficaz é urgente, a
despeito da burocracia,
pois, segundo a Polícia
Rodoviária Federal (PRF),
a BR-163 é a mais
perigosa e campeã no
número de acidentes.
Por esse motivo,
manifestações dos
usuários exigindo
melhores condições de
tráfego podem se tornar
cada vez mais comuns,
como a que ocorreu por
ocasião da visita da
presidenta Dilma Rousseff
ao Estado.
Em Sinop (501 km de
Cuiabá), próximo ao local
onde Dilma embarcaria
num helicóptero rumo a
Lucas do Rio Verde (354
km de Cuiabá), no dia 11
de fevereiro de 2014,
munido de uma faixa o
servidor federal Murilo
Amorim resolveu deixar
registrado seu protesto
contra as péssimas
condições da BR-163.
“Perdi um colega de
trabalho recentemente e,
no mesmo trecho do
acidente, um ônibus
tombou matando quatro
pessoas. A rodovia esta
em péssimas condições,
com buracos, muitos
locais sem acostamento
nem sinalização”, diz. O
protesto teve grande
repercussão nas redes
sociais.
A CONCESSÃO
Com intenso tráfego
de caminhões, a BR-163
é a principal rodovia de
escoamento da safra do
interior de Mato Grosso,
atravessando 19
municípios. A
concessão promete
oferecer pedágio de R$
2,64 a cada cem
quilômetros e há
planejamento para a
construção de nove
praças de pedágio. Ao
todo, R$ 3,6 bilhões em
investimentos ao longo
do contrato são
esperados. De acordo
com a presidente Dilma
Rousseff, o certame de
outro trecho da rodovia,
que liga Sinop ao porto
de Miritituba, no Pará,
sairá ainda esse ano.
Fotos: Mary Juruna
Sobrecarga de tráfego nas estradas é comum num Estado com logística deficiente
Flagrante de acidente ocorrido na BR-163 em 11 de
fevereiro de 2014. Apesar da gravidade, o rapaz sobreviveu
Centro-Oeste deve perder R$ 900 milhões no escoamento
de grãos por conta da falta de estrutura logística em 2014
Para o governador Silval Barbosa, política de concessões
das estradas estaduais é “caminho sem volta”