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CIRCUITOMATOGROSSO
CIDADES
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CUIABÁ, 7 A 13 DE NOVEMBRO DE 2013
TRISTE FIM
Córrego desaparece no Coxipó
As cidades crescem e com o desenvolvimento muitos córregos urbanos são canalizados e transformados
em esgoto. Por: Camila Ribeiro e Sandra Carvalho. Fotos: Mary Juruna
A ocupação
desordenada de Cuiabá e
Várzea Grande e a
construção obras comerciais
e condomínios residenciais
ao longo dos últimos 30
anos provocou o
‘desaparecimento’ de
alguns córregos e a
transformação de outros em
canais de esgoto, a
exemplo dos córregos da
Prainha, Mané Pinto,
Barbado e, mais
recentemente, o córrego
Gelado. O lençol d´água
corta os bairros Itapajé,
Residencial Coxipó e agora
o Residencial Santa
Terezinha, do programa
Minha Casa, Minha Vida,
região sul da capital mato-
grossense. Moradores
lamentam o
desaparecimento do
córrego.
O morador José Maria
da Cruz escreveu para o
Circuito Mato Grosso
contando que ficou
extremamente chocando ao
ver, na semana passada,
centenas de peixes mortos
no córrego – traíras,
acarás, bagres de grota e
lambaris – e seria por conta
da obra do novo
residencial. “Quando a
água não era
contaminada, eu via
urutaus, havia muito peixe e
até jacarés”, relata,
reclamando que a obra –
de responsabilidade da
construtora Lotufo – tenha
prejudicado por completo a
cabeceira.
Maria Irene de Lima
também não esconde a
indignação. Há 24 anos
morando no bairro Parque
Revitalização da nascente é sonho
Em 2012, ainda na
gestão do prefeito
Francisco Galindo
(PTB), uma audiência
pública discutiu a
proposta de
implantação da
primeira Operação
Urbana Consorciada
da capital na área
conhecida como
“nascente da Prainha”,
no bairro Senhor dos
Passos. O local abriga
uma das nascentes do
famoso córrego da
Prainha, que atravessa
boa parte da cidade
até desaguar no rio
Cuiabá. Galindo
terminou o mandado
sem tirar a proposta do
papel A ideia era de
implantar no local um
parque com pista para
caminhada, espaço
para exercícios físicos,
playground e ATI
(Academia para terceira
idade), entre outros
benefícios. Ao lado do
parque seria feita a
revitalização de uma
praça, que já existe no
local, mas que não
possui nenhuma
infraestrutura.
O projeto também
previa a construção de
uma passarela na
Avenida República do
Líbano, em frente a
rodoviária de Cuiabá.
Nascentes são penalizadas
por crescimento desordenado
Tremendamente
cruel. É desta forma que
o professor do
Departamento de
Geologia da
Universidade Federal de
Mato Grosso (UFMT),
Prudêncio Castro,
classifica o modelo de
urbanização da capital
mato-grossense. Ele
assegura que ao longo
dos anos, Cuiabá lançou
mão de um
desenvolvimento pautado
na preservação ambiental
e a consequência disso é
o desaparecimento de
nascentes e córregos que
existiam na cidade.
“Tínhamos o córrego do
Barbado, o do Gambá,
que hoje se
transformaram em
verdadeiros depósitos de
esgoto. É uma situação
triste e ocasionada pelo
crescimento desordenado
da cidade”, lamentou
Castro.
O professor revela
que esta é uma prática
que sempre ocorreu em
Cuiabá e que certamente,
também ocorrerá com as
poucas nascentes que
aqui ainda sobrevivem.
“Aqui nunca existiu um
esforço para conservar a
quantidade e a
qualidade das águas de
nossas nascentes”, disse o
professor. Ele sustentou
ainda, que este é um
empenho que deveria ser
feito por menor que fosse
o curso d’água. Isto
porque, segundo Castro,
conservar os cursos das
nascentes é algo
indispensável, já que o
recurso hídrico é um bem
precioso para a
população.
Especialmente em
Cuiabá, Castro assegura
que a preservação dos
córregos e nascentes
seria indispensável,
porque contribuiria
inclusive, para amenizar
as altas temperaturas
encontradas na cidade.
Ele defende ainda, que
os cursos d’água “se
unem para formar toda
uma rede hidrográfica
que serve como corredor
para fauna existente no
trânsito dos rios, de
forma que todo o ciclo
da natureza é afetado
com essa falta de
preservação”.
Por fim, Castro diz
que em Cuiabá nunca “se
olhou” para a
preservação das
nascentes, das galerias e
matas, “aqui tudo se
destrói e onde existiam
galerias, hoje só
encontramos o
lançamento de esgoto. Se
um dia quiserem voltar
atrás, dificilmente será
possível recuperar aquilo
que foi perdido”.
A passarela teria o
objetivo de melhorar e
garantir a segurança da
população no acesso à
praça e ao parque,
devido ao enorme fluxo
de veículos da Avenida.
Os investimentos
previstos pela iniciativa
privada são de R$ 8,5
milhões, o que inclui o
valor da área do parque
(8.800 m²), de R$ 4
milhões, que seria doado
para o município.
Participaram da
audiência representantes
do Ministério Público
Estadual (MPE), do
curso de Arquitetura e
Urbanismo da UFMT,
do Conselho
Municipal de
Desenvolvimento
Urbano (CMDU),
além de líderes
comunitários.
Residencial, ela se lembra
de quando ali lavava suas
roupas e louças e toda
família tomava banho. “Eu
sempre mantive o quintal
bem limpinho, mas é
verdade que muitos vizinhos
não cuidaram e outros
passaram a jogar a sujeira
de casa no córrego. No
entanto, ele só ficou
totalmente destruído
despois que começaram
essa obra do residencial aí
do lado”, relata Maria
Irene, mostrando o monte
de terra e areia que desceu
com as chuvas, chegando a
encobrir toda a dimensão
do córrego. Nas últimas
semanas, máquinas
abriram uma valeta no
local e começaram a
canalização do “Gelado”.
Quem também se
recorda de como era limpo
o córrego é o catador de
sucatas Joelson Machado.
Ele mora há 20 anos na
região e conta que já
pescou e viu muitos
pegando iscas ali para
pescarias no próprio
Coxipó ou Rio Cuiabá.
“Estou gostando muito de
ver a cidade crescer com
essa obra aí do residencial
Santa Terezinha, mas é
triste ver o fim deste
córrego”.
Para o professor do
Departamento de
Engenharia Sanitária e
Ambiental da Universidade
Federal de Mato Grosso,
Rubem Mauro, é
praticamente impossível
evitar transformações em
córregos urbanos. “A
cidade cresce e sempre
haverá alguma intervenção
no leito do córrego”,
observa, lembrando que
todo obra deve ter
licenciamento ambiental da
prefeitura antes mesmo de
ser iniciada. “Infelizmente
não há muito que fazer em
relação a esses córregos
que ficam dentro da
cidade”, diz o professor.
O professor Juacy da
Silva, fundador da UFMT e
mestre em sociologia, ex-
diretor do extinto Instituto de
Pesquisa e Desenvolvimento
Urbano da Prefeitura de
Cuiabá, o IPDU, observa
que a transformação de
dezenas de córregos em
esgoto a céu aberto ocorre
“ante o olhar passivo,
omissão dos poderes
públicos e de autoridades
que deveriam exercer o
poder de polícia dos
cargos ocupados”.
DENTRO DOS
CONFORMES
De acordo com a
Secretaria de Comunicação
da Prefeitura de Cuiabá, a
Defesa Civil está
acompanhando o
andamento da obra e
todas as medidas
determinadas à construção
estão sendo colocadas em
prática, a exemplo da
construção de bacias de
contenção da água para
evitar alagamentos no
período chuvoso, limpeza
do córrego, contensão de
pedra e terra, além da
construção de três bueiros.
Ma r i a I r ene l emb r a que t oma v a banho
e l avava a s r oupa s da f amí l i a no có r r ego
que ho j e e s t á s endo cana l i z ado
Há 20 ano s na r eg i ão , J oe l son Machado f i ca f e l i z
pe l o p r og r e s so , mas s e en t r i s t ece com o
de s apa r e c i me n t o do c ó r r ego
Loca l onde de v e r i a s e r imp l an t ado um pa r que
e s t á abandonado e v i r ou cana l de e s go t o
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