EDIÇÃO IMPRESSA - 464 - page 7

CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 31 DE OUTUBRO A 6 DE NOVEMBRO DE 2013
CIDADES
P
G
7
PATRIMÔNIO HISTÓRICO
Rixa entre poderes impede revitalização
José Antônio Lemos destaca que não houve investimentos públicos necessários e que brigas políticas podem ter prejudicado a
revitalização do acervo. Por: Diego Frederici. Fotos: May Juruna
Os poderes públicos –
sobretudo da esfera
municipal e estadual –
protagonizaram um conflito
durante muitos anos em
relação ao que deveria ser
feito com o patrimônio
histórico da cidade,
segundo o arquiteto e
professor da Universidade
de Cuiabá (Unic) José
Antônio Lemos, em
entrevista ao
Circuito
Mato Grosso
.
José Lemos destaca
que, além do imóvel
necessitar de características
marcantes de determinada
época para ser tombado,
além da técnica, precisa ter
vinculação com a cidade,
dando exemplo de um
prédio onde tenha
acontecido algo marcante.
Mas lamenta o jogo
político que permeia a
discussão, sobretudo numa
cidade com quase 300
anos como Cuiabá, que
possui exemplos de
arquitetura que valem a
pena ser tombados.
“Assisti, durante muitos
anos, mais um conflito do
que uma tentativa de
acordo entre os poderes. Vi
muitas vezes o município
querer fazer um serviço,
mas aí o Estado não
entrava em acordo e vice-
versa. Acho lamentável,
pois, no caso de Cuiabá,
temos imóveis que datam
do século XVIII que
poderiam ser tombados e
revitalizados, não apenas
pelo seu estilo mas também
pelo vínculo que têm com a
cidade”, diz ele.
De acordo com o
arquiteto, um dos
investimentos mais urgentes
que deveriam ser feitos
Legado histórico vai
além de prédios e
construções antigas
Prédios e
construções antigas não
são itens isolados que
formam o patrimônio
histórico de uma
localidade, pois o
traçado urbano e a
paisagem que
proporciona
determinado ponto
também compõem a
história e a cultura de
uma região, segundo a
doutora em Teoria e
História da Arquitetura
e Urbanismo e
professora da
Universidade Federal
de Mato Grosso
(UFMT) Luciana
Mascaro.
Para Luciana, uma
edificação isolada não
possui o mesmo valor
histórico e cultural, em
termos qualitativos, do
que um conjunto,
dando o exemplo do
Conjunto Arquitetônico,
Urbanístico e
Paisagístico do Centro
Histórico da Cidade de
Cuiabá, e seu traçado
urbano, que remonta
ao início da
colonização da região,
no século XVIII. Ela diz
ainda que esses
espaços são também
fonte de conhecimento.
“Temos no Centro
Histórico aquele
traçado urbano, das
ruas, que permanece
original desde o início
da cidade. Esse traçado
é muito importante.
Uma edificação isolada
talvez não tenha o
mesmo valor em termos
qualitativos, por isso
que o Conjunto
Arquitetônico do Centro
Histórico de Cuiabá
possui relevância. Esses
fatores, além da
paisagem, possuem um
valor histórico e cultural,
além de ser fonte de
saberes daquela
época”, diz ela.
Ela afirma também
que o patrimônio de
uma região tem
fundamental
importância na
identidade e no
sentimento de pertencer
a uma localidade que
recai sobre as pessoas.
“A edificação tem seu
valor histórico e cultural,
e ela também é um
documento que
transmite saberes. O
patrimônio tem um
sentimento de
identidade. Se você não
conhece nada da sua
história, fica parecendo
que não existe nada lá
atrás. Mas, a partir do
momento que você
conhece, forma laços
muito mais facilmente,
cria vínculos com
aquilo. Se você não
entende, não sabe o
que é aquilo, não
atribui valor e fica
fragilizado em sua
autoestima”, afirma ela.
Moradores querem mais segurança
Maria José Teixeira
Figueiredo conhece bem
as ruas e vielas do Porto.
Moradora há trinta anos
no local, a cabeleireira
se mostra interessada em
preservar sua casa, que
possui traços de
arquitetura colonial. No
entanto, lamenta que a
falta de segurança que
permeia os moradores a
obrigou a colocar
grades num imóvel que,
segundo ela, está há
várias gerações em sua
família, e no qual
funciona, até hoje, um
salão de beleza.
“Como o Porto é
hoje em relação a
segurança, acho
impossível deixar de
colocar grades numa
residência. Lamento
fazer isso, mesmo
porque essa casa é da
família há muitas
gerações. Se aqui
reunissem condições que
dessem sensação de
maior comodidade, seria
até algo bom ter um
imóvel histórico. Isso
ajudaria inclusive a
trazer clientes para o
salão de beleza”, opina
ela.
Porto pode ser tombado pelo Iphan
O bairro do Porto
contém boa parte da história
da capital de Mato Grosso.
Como um dos únicos que
beiram o rio que dá nome a
cidade, não é raro
associarmos a localidade
com práticas ilícitas, como
comércio de drogas e
prostituição, devido à
degradação presente em
algumas áreas. O bairro, no
entanto, pode ganhar um
fôlego em sua valorização
cultural e patrimonial devido
a um projeto do Instituto de
Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (Iphan),
que prevê o tombamento
arqueológico da região.
Conceitualmente, para
um imóvel ou região ter
condições de receber
tombamento pelo Iphan, é
necessário que haja
enquadramento em alguns
requisitos, segundo a
superintendente do Instituto
em Mato Grosso, Marina
Lacerda. Ela aponta ainda
que, hoje, as áreas
tombadas pelo órgão
federal contemplam o
conjunto do Centro Histórico
de Cuiabá, e outras
edificações, como a igreja
Nosso Senhor dos Passos,
por exemplo.
“Para um imóvel ser
tombado pelo Iphan é
necessário que ele tenha
algum componente histórico,
arquitetônico, urbanístico,
arqueológico, paisagístico e
de belas artes representativo
no âmbito nacional. Há
também o tombamento por
conjunto, no nosso caso, o
conjunto do Centro Histórico
de Cuiabá, que possui 400
edificações tombadas e 600
na área de entorno”, relata
ela. Manter viva a história e
a cultura de um povo, por
meio da arquitetura e do
urbanismo, não é tarefa
fácil. Para Marina, uma
ação ostensiva do Estado,
como o projeto do
Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) - Cidades
Históricas (que prevê
investimentos de pouco mais
R$ 10 milhões na reforma de
imóveis públicos do Centro
Histórico) são importantes.
Porém, sem uma educação
patrimonial, que faça as
pessoas enxergarem a
importância desses locais,
fica praticamente impossível
deixar essas edificações num
estado próximo ao original.
seria o rebaixamento da
fiação dos postes do
Centro Histórico, tendo em
vista que essa é uma
condição primordial para a
realização de um “trabalho
superficial”. Afirmando que
outros imóveis
contemporâneos também
deveriam receber o
tombamento, o professor
universitário relata que, ao
longo dos anos, os
investimentos públicos
foram insuficientes para
cumprir tal demanda.
“O principal
investimento que deveria se
fazer é o rebaixamento da
fiação do Centro Histórico.
Essa é uma condição
essencial para se fazer um
trabalho superficial.
Outros prédios mais
recentes, como o da
Rodoviária de Cuiabá,
também deveriam ser
tombados, mas,
seguramente, ao longo dos
anos, não houve
investimentos públicos
suficientes, tanto para os
prédios antigos como os
novos”, diz ele.
PAC Ci dade s H i s t ó r i ca s pode da r f ô l ego a imóv e i s que f a z em pa r t e da cu l t u r a e h i s t ó r i a de Cu i abá
Pa r a o a r qu i t e t o J o s é
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s egu r an ç a ao de i x a r imó v e l h i s t ó r i co
p r ó x imo da a r qu i t e t u r a o r i g i na l , no Po r t o
Prédios e casas no bairro do Porto podem ser
enquadradas no t ombamen t o arqueo l óg i co do I phan
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