EDIÇÃO IMPRESSA - 455 - page 4

CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 29 DE AGOSTO A 4 DE SETEMBRO DE 2013
CIDADES
P
G
4
COLETIVOS
Sistema desafia gestores e usuários
A atual frota de ônibus em Cuiabá opera três vezes acima da sua capacidade e com veículos muito acima do prazo de validade
contratual. Por: Mayla Miranda. Fotos: Pedro Alves e Mary Juruna.
Mais do que
promessas, as políticas de
transporte público deveriam
contemplar um amplo
planejamento definindo a
frequência das viagens, a
programação operacional
para que o usuário tenha
condições de chegar ao seu
destino, pistas bem
acabadas, abrigos nas
paradas de acordo com as
distâncias previstas nas
normas de engenharia de
trânsito, veículos
confortáveis garantindo um
serviço de qualidade. O
que se vê em Cuiabá, no
entanto, é uma frota
sucateada, horários
irregulares, falta de
sinalização indicativa de
ônibus nas paradas. E
passageiros espremidos
dentro dos veículos,
chegando atrasados aos
compromissos e
reclamando da demora e
dificuldade para pagar a
passagem ou recarregar o
cartão-transporte. Isto, além
do monopólio do serviço,
que não passa por licitação
há uma década.
Estes são alguns dos
inúmeros problemas do
“O t r an s po r t e púb l i c o
de Cu i abá é
e x t r emamen t e p r e c á r i o
em t odo s o s s en t i do s ,
mas o p i or pon t o é a
demo r a pa r a pa s s a r ; j á
me a t r a s e i d i v e r s a s
v e z e s pa r a
c omp r om i s s o s
i mp o r t a n t í s s i mo s ” .
Rodrigo Taques, auxiliar
administrativo
“ Toda ve z que p r ec i so
chega r no ho r á r i o em
uma c l i en t e , t enho a
ce r t eza de que vou
e spe r a r mu i t o pe l o
ôn i bus , por i s so j á me
acos t ume i a s a i r
ho r as an t e s do
comp r omi s s o pa r a
não chega r mu i t o
a t r a s ada , po r que
me smo me
an t e c i pando bem
sempre atraso”. Diana
Pereira, cabeleireira
“Os ôn i bu s em ge r a l
e s t ão pé s s imo s , ma s o
s u ca t eamen t o da f r o t a
é a i nda ma i s g r a v e .
Não s abe r i a t e d i z e r
quan t a s v e z e s j á t i v e
que de s ce r de um
ôn i bu s qu e b r ado ,
po r que f o r am mu i t a s
v e z e s me smo . Depo i s
d i s s o v oc ê a i nda f i ca
e s pe r ando o p r ó x imo
po r um bom t empo” .
Rubens Sales, pintor
“Os ôn i bu s de
Cu i abá s ó v i v em
l o t ado s e pa r a nó s ,
mu l h e r e s , é a i nda
p i o r, po r que t emo s
que aguen t a r mu i t a
g e n t e
s em edu c a ç ão que
ap r o v e i t a a l o t a ç ão
do ôn i bu s pa r a f i c a r
t i r ando c a s qu i n ha . É
t e r r í v e l t e r que
ague n t a r i s s o t odo s
os dias”. Suzeli
Ferreira, doméstica
ENQUETE
Vereadores se contradizem
no quesito coletivo urbano
Dos cinco
projetos
encaminhados à
Prefeitura pela
Câmara de
Vereadores, somente
um teve aprovação
parcial. O Executivo
aprovou o aumento
do período de
integração, agora de
duas horas e meia.
Os demais
(vetados)
ga r an t em
benefícios aos
usuários do
transporte coletivo na
Capital, a exemplo
do pagamento da
tarifa, via moeda
corrente, volta dos
cobradores,
ampliação do tempo
de integração, passe-
livre irrestrito aos
estudantes, além da
extensão deste
benefício aos
estudantes de pós-
graduação e de cursos
profissionalizantes/pré-
vestibulares.
Na lista de
vereadores que
mudaram de ideia
sobre os projetos estão:
Faissal Calil (PSB),
Wilson KeroKero (PRP),
Lilo Pinheiro (PRP), Júlio
Pinheiro (PTB),
Renivaldo (PDT),
Leonardo Oliveira (PTB)
– líder do governo na
Câmara, Professor
Néviton (PTB), Chico
2000 (PR), Adevair
Cabral (PDT), Mário
Nadaf (PV), Oséias
Machado (PSC), Lueci
Ramos (PSDB),
Domingos Sávio
(PMDB), Adilson
Levante (PSB), Haroldo
Kuzai (PMDB),
Marcrean Santos (PRTB)
e Primo Derley (PTdoB).
O prefeito de
Cuiabá, Mauro Mendes
(PSB), reconhece a má
qualidade dos serviços
prestados no setor e a
falta de estrutura
oferecida pelas atuais
empresas em operação.
“Nós temos muitas
deficiências, mas estamos
focados não só em ter
uma tarifa que represente
a realidade dos custos,
mas também exigir que os
empresários cumpram os
contratos e atendam bem
a população. Entre os
principais fatores a serem
melhorados com certeza
estão os pontos de
ônibus, a frequência e o
atendimento às pessoas
idosas e deficientes. É um
desafio grande que nós
vamos enfrentar e
certamente produzir um
retrato bom para o
próximo ano”, enfatiza.
Ele ainda atribui o
Prefeito admite caos
no transporte público
déficit do serviço
atualmente às atuais
condições de trânsito da
cidade, o que estaria
impossibilitando um
planejamento mais
adequado de frota e
cobrança de frequência.
Desta forma, de acordo
com o prefeito, as
cobranças necessárias
serão realizadas dentro da
realidade que as
empresas estão
enfrentando. Já as
cobranças de ajuste de
conduta também serão
intensificadas para que
haja alternativas para
melhorar os serviços.
“Hoje, lamentavelmente, o
trânsito de Cuiabá está um
caos em função das obras
da Copa e todos nós
estamos sofrendo. Temos
congestionamentos
quilométricos e neste
momento é preciso ter
paciência”, pondera.
Entre as maiores
polêmicas do transporte
público está a volta ou não
dos cobradores de ônibus.
Para a população cuiabana
defensora do retorno, o
cobrador é mais do que um
simples recebedor de
passagens, é também auxiliar
dos idosos e deficientes
físicos.
Para o professor
Eudemir Pereira, caso não
haja mesmo o retorno da
figura do cobrador, é
necessário a modernização
do sistema de entrada dos
cadeirantes ou até mesmo a
contratação de um ajudante.
“Com este atual sistema
arcaico, o cadeirante que
precisa de ajuda acaba
sendo humilhado pela falta
de paciência de muitos, já
que para sua entrada o
motorista tem que descer do
ônibus e esse processo leva
mais de dez minutos. Isto tudo
piora nos horários de pico.
Quero ver como o motorista
lidar com esta situação às 18
Falta de cobradores gera desgaste
horas”.
Outro ponto abordado
pelo professor é que após a
retirada dos cobradores as
tarifas não foram reduzidas.
Outro impasse é o não
recebimento do valor da
tarifa em moeda corrente,
que acaba ferindo o direito
de ir e vir do cidadão previsto
na Constituição Federal.
Defensor dos
cobradores de ônibus na sua
campanha eleitoral, o
prefeito Mauro Mendes
alega que a diminuição
considerável nos casos de
violência no transporte
público vale a pena o
sacrifício gerado pela falta
do profissional.
“Evoluir significa você
estar disposto a repensar
posições. Recebi agora
muitas outras informações, o
que me permitiu reavaliar e
tomar outra decisão.
Quando os cobradores
estavam operando
normalmente nós tínhamos
em média 600 assaltos
registrados dentro dos ônibus
de Cuiabá, muitos destes
violentos, então a retirada
deste dinheiro que chamava
ladrão foi o ponto mais forte
que me sensibilizou”, afirmou
o gestor.
Ainda de acordo com o
prefeito, cerca de 40
profissionais da área
participaram de uma reunião
sobre o assunto e alegaram
não ter a necessidade dos
cobradores dentro dos
coletivos. Mendes ainda
lembrou que com a vinda do
Veículo Leve sobre Trilhos
(VLT) os problemas de
transporte de Cuiabá serão
solucionados. “Como a
bilhetagem do VLT também
será eletrônica, acredito que
a população não terá mais
problemas com a aquisição
das passagens”, afirmou.
transporte público da
Capital. No entendimento
do especialista em
transporte e professor da
Universidade Federal de
Mato Grosso (UFMT)
Eudemir Pereira, este
cenário é o retrato da falta
de priorização dos gestores
que, em tese, deveriam
garantir um transporte
público de qualidade. “Há,
na verdade, uma grande
falta de investimentos tanto
em planejamento quanto na
frota. Nós deveríamos ter
ônibus novos e com
manutenção em dia; é
muito comum você ver os
veículos quebrados no meio
do caminho e a população
à mercê destes descasos”,
analisa.
Ainda de acordo com o
especialista, a atual
concessão descumpre uma
série de regras previstas em
contrato, como o tempo de
vida útil dos ônibus que
seria de no máximo sete
anos, quando a frota mais
jovem já passa dos 10
anos; a falta de
dimensionamento da frota;
a inexistência de
comunicação visual ou
placas sinalizadoras; e o
descumprimento na
frequência de viagens. “Em
outras capitais nós temos a
frota com idade média de
apenas três anos. E observe-
se que a reposição da frota
está prevista na composição
tarifária. Desta forma, posso
garantir que hoje Cuiabá
não tem boas condições de
ônibus, o que prevalece é a
falta de cumprimento
contratual”, alerta.
Já sobre a questão das
tarifas, Eudemir Pereira
garante que o valor está
muito acima do que
deveria, já que não atende
ao consumidor. “Pagar por
um serviço que não
funciona adequadamente é
caro”, destaca lembrando
ainda que a tarifa do
transporte público em
Cuiabá é uma das mais
caras do país.
Outro problema
bastante grave é a
superlotação dos veículos
que acontece basicamente
por conta da falta de
cumprimento dos horários.
Além dos problemas
ocasionados pelas obras de
mobilidade espalhadas
pela Capital, a retirada dos
cobradores também
colabora para os atrasos.
Sem estes profissionais para
prestar auxílio às pessoas
com deficiência e idosos, o
motorista assumiu mais esta
responsabilidade.
“Tenho certeza que
subir um cadeirante em um
ônibus com este sistema
arcaico usado em Cuiabá
não leva menos do que dez
minutos. Nesse momento o
motorista tem que descer e
deixar o veículo ligado, à
mercê de outros riscos no
trânsito. Os usuários que
também não têm acesso ao
cartão-transporte não
podem ser impedidos de
entrar no ônibus sob a pena
de estar violando o direito
de ir e vir do cidadão. Além
do desgaste com o trânsito
pesado da Capital, o
motorista ainda tem que
lidar com todos os outros
percalços”, pondera.
Para solucionar o
problema do transporte
Eudemir Pereira garante
que, além de prioridade,
algumas medidas devem ser
tomadas o mais rápido
possível, como a inserção
de uma faixa exclusiva para
os ônibus, a realização de
uma pesquisa de origem e
destino para, a partir disso,
redefinir o volume da frota,
e a auditoria da tarifa.
“Hoje a tarifa de ônibus em
Cuiabá é uma verdadeira
caixa-preta. Os cidadãos
merecem um transporte
público de qualidade e os
gestores têm como fazer
com que isso funcione bem,
é só ter prioridade”,
sintetiza.
Com o s ho r á r i o s do s ôn i bu s i r r egu l a r e s , a
popu l ação t em que s e amon t oa r pa r a
con s egu i r s e de s l oca r na c i dade
Para o professor Eudemir
Pereira, a falta de
fiscalização do poder
público levou o transporte
coletivo ao caos
Ve í cu l o s em pé s s ima s cond i çõe s e a t end imen t o
caó t i co f echam o cená r i o de de s r e s pe i t o ao s
u s uá r i o s d e ôn i bu s
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