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POLÊMICA
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CUIABÁ, 7 A 13 DE MARÇO DE 2013
Verba de cultura para poucos em MT
´PANELINHA`
Dados oficiais revelam que apenas alguns setores levam a maior parte dos recursos destinados à Cultura.
Por: Mayla Miranda. Fotos: Pedro Alves
Entre 2011 e 2012 a
Secretaria de Estado de
Cultura gastou em torno de
R$70 milhões no setor, de
acordo com o Sistema
Integrado de Planejamento,
Contabilidade e Finanças
(Fiplan). Em que pese esses
investimentos vultosos, os
recursos beneficiaram apenas
alguns setores em detrimento
da grande maioria da
Projetos culturais mudam vidas
Para RiKaeli Ribeiro
Vieira, 20 anos, que faz
parte do projeto social há
três anos, o Instituto
Ciranda garantiu um
futuro diferente do das
suas colegas de bairro, já
que muitas dessas meninas
de sua mesma idade são
mães solteiras ou vivem à
margem da sociedade,
com parceiros envolvidos
no crime.
“Se eu não estivesse
aqui, provavelmente teria
perdido o interesse pela
música e Deus sabe
fazendo o que estaria
agora, mas provavelmente
já estaria com um filho.
Então este projeto foi
definitivo para a mudança
da minha vida”, garante a
estudante que ainda conta
que o seu sonho é ser uma
grande trombonista,
inclusive tocando em
grandes orquestras.
Já para dona
Elizangela Figueiredo
Costa, mãe do aluno
Everson Augusto Costa
Feitosa, 12 anos, o
projeto foi uma garantia
de que seu filho não
ficaria à mercê do crime
no seu horário de
trabalho. “Eu sempre
ficava muito preocupada
com o que o meu filho
estava fazendo, hoje fico
muito orgulhosa dele,
principalmente quando ele
chega em casa me
mostrando uma novidade
que aprendeu na música”,
declarou emocionada,
ainda dizendo que a
relação com o filho em
casa melhorou 100% e as
notas dele ficaram muito
melhores.
Para o Everson, que
agora pretende ser um
grande musicista, o
projeto é muito importante
para o seu futuro: “Eu já
toco flauta e violão,
agora quero melhorar e
aprender outros
instrumentos. A minha vida
já mudou muito depois
que comecei a participar
das aulas e vai mudar
ainda mais”, garante o
jovem músico.
Além do grande
aprendizado, alunos que
participam do projeto
também têm um pontapé
inicial na vida profissional,
já que muitos deles
conseguem ganhar
dinheiro com a música.
Segundo o professor de
música Nemuew Wylk, há
grandes possibilidades de
ganho e um músico pode
ser bem remunerado de
acordo com sua
capacidade e
versatilidade.
“Nós temos diversos
exemplos de jovens que
entraram no projeto e se
profissionalizaram, muitos
deles fazem eventos ou já
participam de grupos ou
bandas, garantindo uma
boa renda. Temos
também alunos que estão
estudando para ser
professor. E assim como
eu, também já estão
conseguindo viver da
música, com um bom
padrão de vida”, conta o
professor que ainda
lembra que muitos desses
alunos vêm de famílias
extremante carentes e logo
no início da carreira
chegam a ganhar mais
que os pais.
O professor ainda faz
questão de ressaltar que a
música não pode mais ser
tratada como atividade
complementar, mas sim
como uma grande aliada
no desenvolvimento
intelectual e na formação
do caráter do cidadão. O
maestro Murilo Alves
lembra que são gastos
cerca de R$150,00 por
ano com um aluno de
música dentro do Instituto
Ciranda; já segundo
dados divulgados pelo
próprio governo, um preso
custa por ano cerca de
R$40 mil.
Atenta, RiKaeli Ribeiro Vieira se agarra à nova oportunidade de vida
Investir em Cultura é
retorno garantido
Cada centavo
investido em cultura
e cidadania tem o
triplo de retorno no
combate da
marginalidade,
analisa o sociólogo
Naldson Ramos.
Além da diminuição
da marginalidade,
os projetos sociais
que abrangem a
área da cultura,
lazer e esportes
ainda têm um
papel muito maior
na formação da
personalidade
destes jovens. As
relações afetivas e
o sentido de grupo
e socialização
garantem a
abertura de novos
horizontes e
colocam regras e
objetivos na vida
deles. “Muitos
destes jovens
passavam o tempo
ocioso nas ruas,
sem perspectiva de
vida, desta forma
tornavam-se alvos
fáceis do crime. A
partir da inclusão
deles nestes
projetos, o
sentimento de fazer
parte garante uma
relação afetiva e
um desenvolvimento
psicomotor que
deveria ser cada
vez mais
incentivado”,
ressalta o sociólogo,
que ainda diz que
estes projetos não
são mais
desenvolvidos por
falta de interesse
público tanto no
âmbito municipal
quanto estadual e
federal.
Ainda segundo
o sociólogo, vários
estudos já
garantiram a
efetividade destas
ações, garantindo
que cada R$10,00
investidos em cultura
são menos R$30,00
gastos na repressão
de crimes. Ele
lembra também que
o desinteresse por
parte dos políticos
em destinar verbas a
estes projetos está
ligado à falta de
divulgação. Neste
sentido é mais
“vantajoso” para o
político investir em
um evento aberto
em que vai ter um
grande público do
que investir em sala
de aula, onde
muitas vezes o povo
(eleitor) não vai ter
conhecimento do
investimento. Esta
inversão de valores
fomenta o baixo
investimento em
projetos efetivos de
mudança de valores
sociais.
QUEM MAIS RECEBEU DA CULTURA 2012
BENEFICIADO
VALOR R$
ASSOCIAÇÃO DOS ARTISTAS E PRODUTORES – FEDART
1.465.000,00
ASSOCIAÇÃO MATO-GROSSENSE DOS MUNICÍPIOS - AMM 1.296.800,00
ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES DE MT
830.000,00
ASSOC. DE TURISMO, CULTURA E MEIO AMBIENTE - INTEGRAR 748.000,00
FEDERAÇÃO MATO-GROSSENSE DE RODEIO
600.000,00
ASSOC. DAS ARTES, COMUNICAÇÃO E CULTURA DE MT
457.884,06
BEZERRA & FERNANDES LTDA
429.083,00
SINDICATO RURAL DE BARRA DO BUGRES
300.000,00
LIGA MATO GROSSO DE RODEIO
250.000,00
PERSPECTIVA 21
200.000,00
CONFRARIA DO NHÔ DITO
120.000,00
BENEF ICIADO
VALOR R$
FEDERAÇÃO MATO-GROSENSE DE CURURU E SIRIRI
800.000,00
ORQUESTRA DE MATO GROSSO
770.000,00
MITRA ARQUEDIOCESANA DE CUIABÁ
598.999,00
ASSOCIAÇÃO CASA DE GUIMARÃES
283.900,00
CONVENÇÃO MINISTROS EVANGÉLICOS ASS. DE DEUS
193.000,00
SINDICATO RURAL DE TANGARÁ DA SERRA
120.000,00
FEDERAÇÃO MATO-GROSSENSE DE RODEIO
120.000,00
QUEM MAIS RECEBEU DA CULTURA 2011
população. Isso significa que
inúmeros projetos são
mantidos com muita
dificuldade por iniciativa
popular enquanto outros
recebem milhões para
projetos temporários e que
muitas vezes nem são de
conhecimento público. Nesse
período a Secretaria de
Cultura esteve sob a gestão
do deputado estadual João
Malheiros (PR), que deixou a
pasta para ser eleito vice-
prefeito de Cuiabá e
renunciar antes mesmo de
tomar posse.
Contrapondo este
cenário, o Instituto Ciranda e
Música e Cidadania foi
fundado em Cuiabá há mais
de 10 anos, trabalha a partir
de iniciativas populares e hoje
se mantém com parceiros da
iniciativa privada e com um
investimento mínimo do
Governo do Estado. “Hoje
todos os nossos recursos
arrecadados para a
manutenção do projeto são
três vezes a mais do que o
valor investido pelo Governo
do Estado. Eles pagam o
aluguel da nossa sede, que
não é exatamente adequada
para o estudo de música,
mas já atende a conta de
água e luz”, conta o
presidente do instituto, Murilo
Alves.
Para a realização do
projeto que surgiu através da
percepção da necessidade
de tirar da ociosidade
crianças e adolescentes na
capital e também da
necessidade de uma escola
pública de música, já que
Cuiabá é uma das poucas
capitais que não oferece este
tipo de ensino no país, foi
fundado o instituto. Para a
viabilidade do projeto
também foi necessária a
formação de professores de
música dos instrumentos da
orquestra sinfônica, muitas
vezes capacitados em
pedagogia musical fora do
estado, além da aquisição de
equipamentos, materiais
didáticos, uniformes e
instrumentos musicais – já que
o projeto é voltado a crianças
e adolescentes carentes e é
totalmente gratuito. Isto sem
contar a estrutura física e
financeira para arcar com um
projeto amplo que conta com
profissionais de diversas
áreas, incluindo a
administração.
Ainda segundo Murilo,
o grande problema de se
conseguir patrocínio para
este tipo de projeto social é
que na maior parte do ano
não há divulgação para os
investimentos oferecidos.
“Os alunos passam muito
tempo em sala de aula
aprendendo a tocar e não
têm como realizar
apresentações; daí vem o
grande problema: o
dinheiro investido na
educação acaba ficando
escondido, o que não é
muito interessante para a
maioria dos políticos”.
Nem mesmo os baixos
investimentos do governo
impedem a expansão do
projeto que somente no
ano passado abriu mais
dois novos polos de ensino
em Chapada dos
Guimarães, atendendo
mais 150 alunos com aulas
todos os sábados. “Se
tivéssemos 3 milhões de
orçamento, com certeza
atenderíamos mais de 500
crianças com aulas todos os
dias. Mas mesmo com os
baixos recursos,
continuamos ganhando
cada vez mais espaço”,
disse Murilo Alves.
O maestro Murilo Alves se mostra indignado com o
desperdício dos recursos culturais
O então secretário de Cultura João Malheiros foi o
responsável pela assinatura dos contratos milionários