CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 6 A 12 DE JUNHO DE 2013
CULTURA EM CIRCUITO
PG 7
PARALELO 15
Por Bolívar Figueiredo
O SENADINHO NA CHAPADA É CULTURA E SOLIDÁRIO
BolívarFigueiredoé jornalistae
artistaplásticoformadoemBrasília,militante
verde e fundador nacional do PV,
sagitariano, calango do cerrado e
assuntadordefatosevarredordepalavras.
Clóvis é historiador e
Papai Noel nas horas vagas
INCLUSÃO LITERÁRIA
Por Clóvis Mattos
MAIS UM PRA PILHA, SÓ UNZINHO...
O cantinho mais
charmoso da Chapada dos
Guimarães, o Senadinho –
criado anarquicamente e
com total informalidade e
boas intenções há cerca de
11 anos, por jovens
senhores, estará
promovendo no sábado, dia
8 de junho, no restaurante
Chapada House, o I Torneio
Internacional de Truco, que
além de homenagear um
dos fundadores do
Senadinho, seu Joaquim
Guimarães, “seu Quincas”,
estará doando parte da
renda das inscrições e da
feijoada a uma entidade de
assistência social. O
Senadinho é também
solidariedade, enfatizou um
dos organizadores do Zap
Truco, Cacildo Macedo:
“Nosso grupo de amigos
quer pontuar e ampliar
nossas ações dentro da
sociedade de Chapada e
dar o exemplo da
importância de se ajudar o
próximo, com alegria e
amizade”. Quando
perguntei por que o torneio
seria internacional, Cacildo
irreverentemente respondeu:
“Na verdade o evento era
para ser galáctico, pois os
homens são de Marte e as
mulheres, de Vênus”,
emendou. Intõ. O Senadinho
está localizado dentro do
conjunto arquitetônico e
histórico da Igreja Matriz de
Nossa Senhora de Sant’Ana.
Um espacinho de 5 m², com
duas mezinhas, no marco
zero, porém de grande
ressonância na sociedade e
da sociedade, pois
encontramos entre os
“senadores” de plantão
empresários,
jornalistas,filósofos,
contadores de causos,
fotógrafos, pintores,
aposentados, famílias
tradicionais da cidade,
piadistas... Tem até um
gaúcho. Digamos assim: o
espaço tem influência grega,
pois lembra muito a prática
que deu origem à
democracia, quando, em
praça pública, os gregos
discutiam e decidiam os
destinos da cidade, em
reuniões plenárias. E assim é
o Senadinho, que é legal
mas não oficial, e em março
de 2011 recebeu até uma
placa comemorativa,
demarcando o local. E em
artigo único, está estampado
na placa: “É proibido
proibir” – quer algo mais
moderno que isso? No
“anexo” do Senadinho,
temos também o
prolongamento natural do
local – o eixo da
comunicação, com a
distribuição de jornais por
parte do Luizinho, integrante
mais jovem do Senadinho,
um tipo de assessor de
imprensa, e a Rádio
Natureza. Como vemos,
Chapada possui uma caixa
de ressonância que inclui,
além da rádio “peão” do
Senadinho, do Jornal do
Poste, da Rádio Natureza, os
jornais do Luizinho e da
minha coluna, é claro. Para
o “senador” vitalício,
professor Eleni Aves, o
Senadinho vai além de
encontros de amigos, e de
um clube. “Aqui resgatamos
e reafirmamos nosso amor
pela cidade, implantando
uma relação de amizade
entre os integrantes, com o
objetivo de servir a
sociedade”. Vida longa ao
Senadinho, antro saudável
de formadores de opinião,
que sabem o valor da
comunicação e da
mobilização. Saravá, Amém,
até semana que vem.
RICARDO SANTOS*
Kaíque chegou num
ponto em que mal
conseguia entrar no
quarto. Era livro demais.
Os armários estavam
abarrotados, quase não
havia espaço pra roupa.
As prateleiras envergadas.
Pilhas e mais pilhas no
chão se equilibravam
bambas, umas até a linha
de cintura, outras até a
cabeça. Uma pequena
pirâmide de livros robustos
se tornara a cômoda; ali
ficavam celular, carteira,
alarme. Embaixo da cama
não cabia mais nem um
gibi do Tio Patinhas.
Inclusive, quando um dos
pés da cama quebrou,
Kaíque pegou uma
coleção de clássicos em
capa dura e colocou no
lugar. Ficou melhor que
antes. Fez o mesmo com
os outros três pés.
Tinha de tudo: livro,
gibi, guia ilustrado,
dicionário, mapa, álbum
de figurinhas,
enciclopédia, manual de
roteiro, manual de
marcenaria, manual de
etiqueta. Capa dura, capa
mole, lombada quadrada,
grampo, encadernação em
couro, pocket, omnibus,
absolute, widescreen,
recorte e cole, xerox,
espiral, no plástico, em
sacola, em caixa box,
caixa de sapato, caixa de
TV.
Colecionador não
seria bem a palavra certa.
Acumulador, talvez. Não
havia muita seleção; tudo
o que via e se encontrava
ao alcance financeiro/
físico Kaíque comprava/
emprestava/pegava.
Queria cultura, qualquer
tipo de cultura, e muito
mais do que era
humanamente possível
consumir na velocidade
que adquiria. Não
importava se não
conseguisse ler algo logo;
estava lá, um dia chegava
a hora. O apocalipse
podia acontecer depois da
porta do quarto; ali dentro
ele tinha o que precisava
para passar o tempo.
Água e comida vinham em
segundo lugar.
Comprou iPad,
Kindle, Kobo. Vendeu,
não era a mesma coisa.
Queria pegar, cheirar,
sentir.
No dia da
mudança, sua crença foi
abalada. O locador
precisava do
apartamento. Kaíque
conseguiu outro menor e
mais em conta num
bairro vizinho, segundo
andar. Encaixotou tudo.
Alugou um caminhão de
frete. O desce e sobe
arrebentou sua coluna.
Quando largou a última
caixa no apartamento
novo, ganhara uma hérnia
de disco. Se tocou: tinha
coisa demais. Fez um
limpa de cortar o coração;
manteve 20% do total, só
o fino do fino, o que não
conseguiria viver sem. O
resto foi para uma
pancada de sebo.
Levantou uma graninha,
reformou o apê e deixou
o tempo passar. Pensou
em se tornar mais seletivo,
comprar só de vez em
quando.
Um ano mais tarde,
não conseguia entrar no
quarto.
*Ricardo Santos é
jornalista e escritor.
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