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SAÚDE
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CUIABÁ, 2 A 8 DE AGOSTO DE 2012
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REMÉDIOS NATURAIS
Cuidado com promessas milagrosas
Ervas podem complementar tratamento, afirmam especialistas, mas trocas remédios por chás representa um risco à saúde.
Por Andhressa Sawaris Barboza. Fotos: Mary Juruna
Na cultura popular é
comum o uso de chás
como possível tratamento
de enfermidades. De
insônia, dor de cabeça
até anomalias mais
complexas como o
câncer, há “remédio”
para tudo. “Se não faz
bem, também não faz
mal”, dizem os “raizeiros”,
mas especialista afirmam
que não é bem assim. O
uso de produtos naturais
sem acompanhamento
médico pode trazer danos
à saúde e abandonar o
tratamento pode ser fatal.
Pior: alguns
medicamentos “naturais”
podem ser falsos. É o
caso de um desses
produtos que promete
regular diabetes e
colesterol.
Na embalagem do
“Chá da Vida”, por
exemplo, a composição
diz conter insulina, um
hormônio produzido
somente pelo corpo
humano e usado no
tratamento de diabetes.
Mas os problemas não
param por aí, o endereço
fornecido, que seria em
Cuiabá, não existe e o
CEP é de Campo Grande,
no Mato Grosso. Nem
mesmo o CNPJ informado
é cadastrado no sistema
da Receita Federal. E por
último, na embalagem
cita uma lei fictícia que
regulamentaria a isenção
do registro do produto.
O Conselho Regional
de Medicina alerta que o
diabetes é uma síndrome
metabólica que decorre
da falta de insulina ou da
incapacidade dela exercer
adequadamente seus
efeitos. A insulina é
produzida exclusivamente
Noni é a bola da vez -
O “noni” apareceu nos últimos tempos como o
mais milagroso remédio natural, capaz de emagrecer e curar até câncer, de
acordo com os raizeiros e informações que são divulgadas na internet.
“Nem a carqueja, nem o noni tem comprovação científica de que
funcionam”, avisa a médica Dalva Alves.
Especialista recomenda
ervas como complemento
O terapeuta Ami r El
Aouar conta que ut i l i za
da chamada “medicina
da f lores ta” como um
dos métodos para
t ratamento de
en f ermi dades
relacionadas à
ps iquiat r ia e
ps icologia. Apesar de
ader i r a métodos
al ternat ivos, Ami r
acredi ta não se pode
desprezar os
medi camentos
s intet i zados em
laboratór io. “As
pessoas conscientes
não abandonam a
medicina t radicional ,
porque elas devem se
complementar”, conta.
Partindo de uma
concepção filosófica,
Amir conta que o ser
humano deve ser visto de
forma holística, integral e
todo tratamento
alternativo deve
potencializar a melhoria
no estado de saúde, mas
nunca deixar de lado a
opinião de médicos e
especialistas. O terapeuta
é contra a venda
indiscriminada desses
produtos. “Acredito que
tanto os medicamentos
alopáticos, da medicina
tradicional, quanto os
homeopáticos e as ervas
naturais precisam de
legislação específica e
controle do comércio”,
afirma. Isso porque as
plantas teriam princípio
ativo de substâncias que
devem ser ministradas em
dosagens de acordo com
a doença e o organismo.
Amir é sistematizador
do Programa de
Sustentabilidade Integral,
chamado de
3eco, realiza palestras,
cursos e vivências sobre
temas relacionados à
Ecologia Humana, entre
eles a “medicina da
floresta”.
pelo pâncreas e é
responsável por “queimar
o açúcar”, ou seja,
metabolizar a glicose. A
falta desse hormônio
provoca o diabetes, assim
o paciente precisa tomar
medicamentos
especializados para
controlar o nível de glicose
no organismo.
Apesar de
cadastrados pela
Prefeitura de Cuiabá, os
raizeiros se mostram
despreparados para
comercializarem ervas e
raízes. A equipe de
reportagem do
Circuito
Mato Grosso
simulou
uma compra para um
possível paciente diabético
que estaria fazendo o
tratamento médico. Em
todos os comerciantes de
produtos naturais a
recomendação é para que
o doente deixe de tomar
remédios receitados por
médicos para fazer o
tratamento exclusivamente
com chás.
A presidente do
Conselho Regional de
Medicina, Dalva Alves, é
taxativa quando
questionada sobre o
assunto. “Toda atenção é
pouca quando falamos de
doenças, para usar
produtos, mesmo que
naturais, o paciente deve
ter um acompanhamento”.
Para a médica, se não
tem estudos científicos que
comprovem a eficiência
daquela erva, também é
possível garantir que não
faça mal. “Pode ser
benéfica ou maléfica,
acontece que muitas não
têm efeito ou fazem mal”,
ressalta. Dalva afirma
ainda que o grande
problema está quando o
paciente deixa de tomar
remédios e proceder ao
tratamento como
recomendado pelos
médicos, para tomar chás
e outras terapias
alternativas.
Foi o caso do pai do
estudante e ator João
Manuel da Mota, que foi
diagnosticado com
melanoma, um tipo de
câncer que atinge a pele.
Apesar de ter sido
atendido em uma das
maiores referências no
país, o Hospital
Beneficência Portuguesa,
em São Paulo, seu pai,
Salmo da Mota optou por
não fazer a quimioterapia
para se dedicar ao
tratamento alternativo. À
época, ele e a esposa
participavam de um grupo
filosófico-religioso
dissidente da “Cultura
Racional”, uma escola
esotérica que ficou
conhecida em meados de
1970, devido à
repercussão feita pelo
artista Tim Maia quando
se tornou adepto.
De acordo com João
Manuel, o pai teria feito o
tratamento com ervas
Produto para diabetes é comercializado sem registro, com endereço e CNPJ falsos e ainda garante que tem insulina na composição
como o Ypê Roxo, Folha
de Carne e aplicações de
argila. Salmo faleceu
quatro anos após o
diagnóstico, mas João
afirma que respeita a
opção do pai. “Minha
mãe acredita que o
tratamento foi eficiente
sim, porque ele não sofreu
com dores, além disso, ele
tinha uma concepção
diferente sobre a morte”,
explica. Mas, ainda conta
que o assunto ainda gera
discordâncias, pois sua
irmã, não aceitaria a
situação e afirma que o
pai foi influenciado por
amigos da religião que
participava.
“É uma saudade, mas
já não é uma dor, eu
acho que se naquela
época eu tivesse a idade
que tenho hoje tentaria
convencê-lo a pelo menos
tentar os médicos, mas foi
uma escolha dele e eu
respeito”, diz.
Para a médica Dalva
Alves, ao interromper a
medicação ou substituir o
tratamento por ervas o
paciente pode estar
colocando sua vida em
risco. Ela conta que já teve
pacientes com câncer que
deixaram de lado o
tratamento tradicional por
terapias alternativas e
nenhum deles apresentou
melhorias no quadro da
saúde. “Todo médico
passa por isso e depois o
paciente volta ainda pior
e, em alguns casos é
irreversível”, lamenta.
Raizeiros são cadastrados pela Prefeitura, mas não têm preparo para orientar
CRM alerta para os riscos em abandonar o
tratamento médico por terapias al ternat ivas
João Manuel acredita que o pai poderia ter
uma sobrevida maior, mas conta que o tratamento
minimizou alguns efeitos da doença