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CUIABÁ, 19 A 25 DE JANEIRO DE 2012
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Cidade no limbo do desenvolvimento
VARZEA GRANDE
Analistas e políticos explicam os caminhos que levaram Várzea Grande, o segundo maior colégio eleitoral de Mato Grosso, a ficar
no limbo do desenvolvimento.
Por Neusa Baptista. Fotos: Mary Juruna
Várzea grande, a
pujante Cidade Industrial,
parece hoje estar reduzida
a uma triste cidade
dormitório. Com um
passivo de quase R$ 10
milhões, o prefeito
Sebastião Gonçalves
(PSD), tenta reerguer os
pilares da herança maldita
das más administrações
anteriores e, de quebra,
dar destaque político para
si e para o novo partido.
Com R$ 30 milhões
de dívidas no Pronto-
Socorro, Várzea Grande
enfrenta problemas
também na atenção
básica à Saúde. A cidade
tem um dos piores índices
nacionais de atendimento
do Programa de Saúde da
Família (PSF), segundo
aponta o pré-candidato a
vereador pelo PTC e ex-
secretário de saúde do
município, Fábio Saad. A
cobertura de atendimento
nos PSFs é de 22%, está
abaixo da nacional, que é
de 50% na maioria das
capitais, de acordo Saad.
Os recursos no PS
deveriam ser 80%
maiores, segundo aponta
o ex-gestor da pasta,
lembrando que 40% dos
pacientes são do interior.
Além de R$ 1,2 milhão
repassado mensalmente
pelo Governo do Estado
para gestão do Pronto
Socorro, há R$ 20 mil por
mês para cada uma das
sete unidades dos PSFs e
R$ 300 mil mensais do
Programa de Atenção
Básica para manutenção
das cinco policlínicas e três
Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS), além
dos repasses referentes a
procedimentos cirúrgicos.
A prefeitura prometeu
para o início de 2012 a
ativação de quatro centros
cirúrgicos equipados. Para
ele, é preciso haver “um
ciclo evolutivo” em Várzea
Grande. “O município
precisa comprovar sua
boa fé em administrar
corretamente os recursos
para renegociar as
dívidas e captar outros”.
Na Educação, um
dos problemas é a gestão
dos recursos. Há,
inclusive, acusações de
improbidade
administrativa contra o ex-
prefeito, Murilo Domingos
(PR), Gonçalves e o
engenheiro da prefeitura,
Waldisnei Moreno Costa,
que são réus de uma
ação proposta há dois
anos pela 1ª Promotoria
de Justiça Cível da
Comarca de Várzea
Grande do Ministério
Público, com base em
representação remetida
pelo Conselho Municipal
de Educação (Câmara de
Fiscalização do FUNDEB),
que apontou
irregularidades em obras
de reformas de escolas
municipais. Segundo o
processo, as construtoras
Cristalino e Prado
Engenharia teriam
recebido pelo serviço sem
ter cumprido integralmente
o contrato de execução
das reformas. A ação
prevê a devolução de R$
498.073,87 ao erário.
ANÁL I SE
Para Manoel Marta,
professor aposentado da
faculdade de Economia
da UFMT, o problema na
cidade industrial não é só
político, mas também
econômico. A indefinição
política é um dos fatores
que afasta novos
contratos. Ele exemplifica
com a parceria firmada
em setembro entre a
prefeitura de Cuiabá e a
Coca Cola para o projeto
Valorizando Vidas no
Aterro Sanitário, que tem,
entre as atividades, a
reciclagem de garrafas do
tipo PET, financiada pelo
BNDES em R$ 50 milhões.
Marta questiona o fato de
o recurso não ter ido para
Várzea Grande, onde fica
a fábrica da Coca Cola.
“O empresário não entra
em bola dividida e lá na
cidade vizinha da capital
não se sabe até hoje
quem está no poder. O
Sebastião está,
pero no
mucho;
o (José) Riva
(deputado e presidente da
Assembleia Legislativa)
está muito presente em
tudo. A gente fica
assustado com o poder
que ele tem”, analisa.
Na segunda semana
de janeiro, o prefeito
afastado Murilo
Domingos (PR) perdeu
mais uma chance de
voltar ao poder. O
recurso proposto por ele
para cassar a decisão da
juíza Anglizey Solivan, que
não acatou recurso
anterior datado de agosto
de 2011, recebeu
votação desfavorável e foi
negado pelo Tribunal de
Justiça de Mato Grosso
(TJ-MT). A ação de
improbidade
administrativa, emitida
pelo juiz Onivaldo Budny,
da 3ª Vara de Fazenda
Pública de Várzea
Grande, cassou os direitos
políticos de Domingos por
cinco anos.
Outro sintoma dos
reflexos econômicos dos
problemas políticos,
segundo ele, é a
debandada de mais de 30
empresas madeireiras de
Várzea Grande para o
interior. Para o
economista, de industrial a
cidade não tem mais nada
e é hoje “uma cidade-
dormitório que procura
sua identidade”.
Tantos problemas,
nem um staff ‘turbinado’
conseguiria resolver,
segundo Marta. Para ele,
Yênes Magalhães pouco
poderá fazer à frente da
pasta de Assuntos
Estratégicos, já que não
conta com a estrutura e
pessoal com o qual está
acostumado e não tem o
perfil de “trator” a la Éder
Moraes (gestor da
Secretaria Extraordinária
da Copa do Mundo –
Secop) para fazer o que a
situação exige. “Quando
ele terminar de arrumar a
casa, acabou o
mandato”.
Fazendo um resgate
histórico,
Marta
lembra de
meados de
1973,
quando a
instalação
da fábrica
da Sadia
em Várzea
Grande foi
uma das
marcas do
rompimento
com as
oligarquias
locais, os Campos e os
Baracat. Com a subida de
Murilo Domingos ao
poder, em 2009, o que se
esperava e não ocorreu
era uma administração
com perfil mais
empresarial, prático e
estratégico, mas “nem
Murilo, nem Zaeli (como
era conhecido
politicamente Sebastião
Gonçalves) acertaram na
estratégia”, diz o
professor.
Outro problema a ser
enfrentado, lembra, é
prazo para adequar o
lixão às determinações
da nova legislação de
resíduos sólidos, que
fixou em 2014 o prazo
máximo para que todos
os lixões se tornem
sustentáveis e não
poluam.
O analista político,
Alfredo da Motta
Menezes, é outro que diz
não conseguir entender a
matemática que impede
Várzea Grande de ser
uma cidade modelo, já
que tem todas as
condições para isso:
colégio eleitoral forte (é
a segunda do Estado em
número de eleitores); é a
segunda em arrecadação
de ICMS; não enfrenta os
problemas que afetam a
população da zona rural
e possui poucas escolas
municipais, 72, o que,
em tese, facilitaria a
melhoraria da qualidade
na Educação.
Uma das causas
apontadas por Menezes
para os problemas
enfrentados hoje, na
cidade, é o estilo de
governar antiquado, com
base no compadrio, que
persistiu por muitos anos.
Ele permitiu, entre outras
coisas, o desvio de
recursos para os “amigos
do rei”. O compadrio
provocou inchaço na
máquina e teve influência
no déficit de
arrecadação municipal,
já que, ao longo de
algumas administrações,
foi prática comum
conceder isenção de
impostos a amigos ou
parentes.
Menezes questiona
algumas contradições:
“Como uma cidade que
fica ao lado
do rio
Cuiabá tem
problemas de
água? Será
que houve
interesse de
que isso fosse
assim, para
usar os poços
artesianos
como moeda
de troca por
votos?”.
Questionado
sobre o
assunto, o vereador
Toninho do Glória (PV)
apontou a falta de espaço
na antiga administração,
da qual Gonçalves
compôs o staff, como a
causa da aparente inércia
do atual prefeito. “Houve
um acordo entre ele e
Domingos para uma
gestão conjunta, mas Zaeli
não estava tendo espaço
na gestão. Agora é
diferente, ele tem a caneta
na mão, vai tirar o
desgaste desta
administração”, apostou.
Candidato derrotado
à prefeitura e um dos
nomes cotados para
representar o PMDB na
disputa ao cargo no
próximo ano, o deputado
estadual Wallace
Guimarães evitou criticar o
antigo opositor e diz que
“para mim não é vital ser
prefeito, mas sim ver a
cidade bem
administrada”. Ele
justifica o caos atual em
VG com a inoperância
dos governos
antecessores, admite
entender as dificuldades
passadas por Zaeli, mas
cobra uma posição mais
Para professor
aposentado da
faculdade de
Economia da
UFMT, o problema
na cidade industrial
não é só político,
mas econômico.
firme do gestor, pois
argumenta que a
indecisão municipal
interfere na atuação do
deputado estadual, que se
vê impedido, por
exemplo, de encaminhar
emendas parlamentares
para setores como Saúde.
Esta pasta, segundo ele,
só precisaria do acréscimo
mensal de R$ 800 mil
para funcionar a contento.
“Zaeli está no momento
dele de fazer as
mudanças, precisa parar
de olhar o passado”.
Com uma receita
anual de R$ 240 milhões,
considerada insuficiente
até por membros do
próprio staff, o atual
prefeito parece estar
querendo arrumar a casa.
Depois de mexer em áreas
como a saúde,
empossando, em
novembro passado, o
administrador Marcos José
da Silva como secretário
da pasta, e de abrir 15
novos leitos no Pronto
Socorro Municipal, ele
tenta oxigenar a Secretaria
de Receita, para onde foi
nomeado, na última
semana, o advogado e
administrador Jorge
Merquíades de
Magalhães, que tem perfil
mais técnico que político e
bom trânsito em órgãos
como a Secretaria de
Estado de Fazenda, onde
ocupou o cargo de Agente
e Fiscal de Tributos
Estaduais. Com formação
em Direito Financeiro e
Tributário, uma das metas
do novo secretário é trazer
mais recursos para Várzea
Grande, principalmente
para a industria. Por isso,
um dos primeiros órgãos a
receberem visita da
administração municipal
de Várzea Grande é a
Secretaria de Estado de
Indústria, Comércio, Minas
e Energia (Sicme).
O deputado José
Riva, presidente do PSD,
foi curto e grosso ao
afirmar que ainda é cedo
para avaliar a gestão de
Gonçalves, mas acredita
que o prefeito está
tomando atitudes de quem
quer acertar. “Ele vai fazer
um grande mandato,
botar Várzea Grande nos
eixos”.
O senador Jayme
Campos (DEM) também
foi econômico e formal ao
tratar do assunto. Uma
das principais lideranças
da família Campos e
prefeito de Várzea Grande
por três mandatos, ele
manifestou, por meio de
nota via assessoria de
imprensa, seu pesar com
problemas como a falta
de asfalto e saneamento
básico na cidade. “Como
cidadão várzea-grandense
eu torço para que a
cidade entre nos eixos,
que os problemas
estruturais sejam sanados
com bastante empenho
por parte da gestão
pública atual e que,
sobretudo, haja vontade
política na solução dos
problemas”, resume a
nota.
OUTRO LADO
Procurados para falar
sobre o assunto, o ex-
prefeito Murilo Domingos
(PR) e o atual, não foram
localizados pela
reportagem. Domingos
não atendeu ao celular e
Sebastião Gonçalves se
encontrava em reunião em
seu gabinete.
A cidade, que fica ao lado do rio Cuiabá, tem problemas de
água por conta do interesse de que fossem usados os
poços artesianos como moeda de troca por votos
O prefei to Sebast ião
Gonçalves (PSD) tenta
reerguer os pi lares da
herança maldita das más
admini st rações anter iores
e, de quebra, dar destaque
político para si e o PSD
O companheiro de
partido e presidente da
AL, José Riva, acredita que
o prefei to está tomando
atitudes de quem
quer acertar e vai colocar
VG ‘nos eixos’