CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 5 A 11 DE JUNHO DE 2014
POLÊMICA
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MT PREPARATÓRIO
Desperdício de R$ 20 milhões
Investimento dos cofres públicos foi desperdiçado e deixou alunos da rede pública com poucas opções
ENQUETE
João Vítor Ribeiro Tavares –
Estudante do
último ano do ensino médio no Liceu Cuiabano, na
capital, João Ribeiro Tavares quer fazer o vestibular e
estudar Engenharia Civil na UFMT. Diferente de
muitos outros que têm a mesma oportunidade, ele
ainda tem a chance de frequentar o Cuiabá Vest, na
capital, para se preparar melhor, pois, de outro modo,
acha que não poderia fazer um cursinho: “Concorri
com outras pessoas para ganhar bolsa, mas mesmo
assim ia ter de pagar 600 reais. É muito pesado”
Nadja Maria de Santos –
Nadja Maria de Santos,
de 18 anos, é uma das alunas que frequentam o
terceiro ano do ensino médio na Escola Estadual Liceu
Cuiabano. A jovem estudante sonha alto e quer fazer
Medicina na Universidade Federal de Mato Grosso. Ela
queixa-se que não tem condições de pagar por um
cursinho pré-vestibular tradicional, que na capital
pode ultrapassar R$ 1 mil por mês, mas não desiste:
“Faço aula de gramática e participo dos aulões para ter
mais chance”
Diego Frederici
O vestibular é uma
das etapas cruciais na
vida de uma pessoa. Ter
o direito de frequentar o
ensino superior numa
universidade pública é o
anseio de muitos jovens e
famílias, dadas as
oportunidades de
crescimento profissional,
pessoal e intelectual que a
vida acadêmica pode
proporcionar.
Infelizmente, os
estudantes da rede
pública de Mato Grosso
parecem estar ainda mais
em desvantagem em
relação ao ensino privado,
tendo em vista que o
cursinho estadual gratuito
MT Preparatório foi
suspenso pelo governo.
Criado em 2009 ainda
no governo Blairo Maggi,
que na época o batizou de
MT Pré-Vestibular, o
programa tinha como
objetivo suprir parte das
deficiências do ensino
público formal em Mato
Grosso (veja matéria
abaixo), oferecendo aos
filhos e filhas da classe
trabalhadora condições
mais favoráveis de
“Curso surgiu por razões partidárias”
O Exame Nacional do
Ensino Médio (Enem) é
uma das iniciativas
políticas mais importantes
da sociedade brasileira.
Hoje o exame deixou de
ter o caráter meramente
avaliativo de quando foi
criado, em 1998, e passou
a ser porta de entrada para
a maioria das
universidades públicas do
país, além de ser pré-
requisito para o acesso a
programas sociais de
financiamento estudantil,
como ProUni e Fies. Os
alunos do Estado, no
entanto, sofrem não só
com a depreciação do
ensino como ainda estão
ao sabor de interesses
partidários.
Para o coordenador
geral da Escola Estadual
Liceu Cuiabano, Alceu
Trentini, o MT
Preparatório só existiu por
“interesses partidários” de
representantes do governo
estadual que desejavam
dar uma resposta ao
Cuiabá Vest – cursinho
gratuito oferecido pela
Prefeitura de Cuiabá.
Porém, de acordo com
Trentini, que também já
foi diretor da instituição,
“não havia estrutura” para
oferecer aos alunos e
fazer com que eles
frequentassem o cursinho
gratuito ministrado por
meio de vídeo-aulas.
“Não ofereceram para
os alunos vale-transporte,
nem intérpretes para os
deficientes auditivos. Os
discentes chegavam aqui e
não compreendiam as
aulas. Fizemos um
documento,
encaminhamos para a
Seduc e eles disseram que
era problema da Secitec”,
afirma. A desvantagem
dos alunos de escolas
públicas e privadas é
expressa em números do
próprio Ministério da
Educação (MEC). Nenhum
dos 20 colégios mais bem
classificados no Enem em
Mato Grosso é estadual.
O coordenador do
Liceu queixa-se ainda da
evasão de alunos do MT
Preparatório. Segundo ele,
assim que as aulas
começavam as salas
ficavam cheias, com 60
pessoas no período
matutino e outras 60 no
noturno. No entanto, com
menos de um mês do
início das atividades, a
frequência caía
drasticamente.
“Depois de uma
semana, apareciam três ou
quatro alunos dos 60 que
começavam. Em muitos
dias não vinha ninguém”,
diz ele.
disputa com estudantes
que tinham origem em
famílias que podiam
custear um cursinho
convencional.
Dois anos depois da
criação, a Fundação de
Apoio a Educação e ao
Desenvolvimento
Tecnológico de Mato
Grosso (Fundetec) foi
escolhida para dar
continuidade ao projeto,
que agora se chamava MT
Preparatório, num
polêmico processo que
envolveu até dispensa de
licitação.
O cursinho pré-
vestibular do governo
funcionava por meio de
vídeo-aulas que poderiam
ser acompanhadas em
escolas ou espaços
físicos presentes em
outros órgãos públicos de
todo o Estado.
A instituição recebeu
R$ 20 milhões para
realizar o serviço nos
anos de 2011 e 2012.
Porém, as suspeitas de
fraude, a obtenção de
serviços em prefeituras
do Estado – como Cuiabá,
Várzea Grande e
Rondonópolis –, também
por dispensa de licitação,
e os indícios de
favorecimento à
Fundetec, pois um dos
seus fundadores, o
deputado federal Eliene
Lima (PSD), era à época
secretário titular da
própria Secretaria de
Estado de Ciência e
Tecnologia (Secitec), que
geria o MT Preparatório,
fizeram com o que o
governo rompesse com a
Fundação.
Hoje o MT
Preparatório está
suspenso, tornando o
sonho do ensino superior
público gratuito uma
realidade distante para
jovens que são
subjugados pelas faltas de
oportunidades de
crescimento em nossa
sociedade.
Em nota, a Secitec
admitiu que o MT
Preparatório “não está em
execução em 2014”,
afirmando que há previsão
de “iniciar no segundo
semestre”, sem
especificar uma data para
a retomada das aulas. No
entanto, é pouco provável
que o projeto saia nos
próximos meses, pois,
ainda de acordo com
informações da
Secretaria, “nenhuma
empresa está envolvida
com o programa no
momento, que está em
fase de licitação”.
Fotos: André Romeu
Estado investiu R$ 20 milhões numa empresa com histórico de contratação sem licitação
Alceu Trentini,
coordenador geral do Liceu
Cuiabano
,
afirma que MT
Preparatório não oferecia
recursos para manter
frequência dos alunos