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PANORAMA
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CUIABÁ, 29 DE MAIO A 4 DE JUNHO DE 2014
www.circuitomt.com.br
HAITIANOS
Estrangeiros enfrentam dificuldades
Abertura do país para receber os haitianos semprojetos de políticas públicas temdificultado a vida demuitos deles por não dominarem a língua
Rafaela Souza
Enfrentar
di f iculdade já faz par te
da vida de mui tos
hai t ianos que buscam
melhores condições de
vida no Brasi l . Mui tos
que passaram pela
di tadura, guerra civi l e
depoi s a pior de todas
as turbulências , que foi
o ter remoto que
devas tou o pa í s ,
encont raram em Mato
Grosso um refúgio.
Porém, as di f iculdades
para encont rar
emprego e se sus t ent ar
es tão gerando novos
problemas sociais
devido à fal ta de
pol í t icas públ icas para
receber esses
est rangei ros.
Ent re as pr incipais
di f iculdades dos
hai t ianos no Brasi l está
o fator idioma. A
maior ia não entende e
nem sabe fa l ar o
por tuguês e por i sso
tem grandes
di f iculdades de arrumar
emprego na sua área de
formação e acaba
sempre sendo
di recionada para a área
da cons t rução civi l .
Para completar,
algumas empresas têm
se aprovei tado da fal ta
de conhecimento desses
trabalhadores. Entre os
problemas apontados
está a demissão logo
após os t rês meses de
experiência para que o
empregador não tenha
responsabilidades
trabalhistas. Além
di sso, por causa da
fal ta da fluência na
l íngua portuguesa,
Quem costuma andar
pelo centro de Cuiabá
provavelmente já viu
alguns estrangeiros
vendendo produtos
importados, como
relógios e óculos, e vistos
pela população como
originários do Haiti.
Conversando com alguns
deles, o
Circuito Mato
Grosso
diagnosticou que a
maioria é do Senegal, país
que fica no oeste da
África.
Em depoimento, eles
disseram que descobriram
que no Brasil havia
grandes oportunidades de
emprego e por isso
aproveitaram o momento
para migrar para cá e
ajudar a família.
Entre eles está Aléx
Kébe, 24 anos, que
trabalha como vendedor
ambulante e encontrou em
Haitianos não são os
únicos estrangeiros
Apesar de ser uma
das principais formas
de mão de obra no
Brasil para as
construções da Copa,
os haitianos nas últimas
semanas foram vítimas
nas redes sociais, onde
circularam informações
sobre a possível
contaminação de Ebola,
principalmente dos
imigrantes que entram
no país pelo Acre.
De acordo com a
informação, os
haitianos estavam
chegando ao Brasil com
Ebola, doença típica da
África, mas o que
muitos desconhecem é
que o Haiti é um país
que fica localizado na
América Central, onde
Falta de conhecimento
gera preconceito
O fato de não
dominar o português
não dificul ta apenas no
momento de arrumar
emprego, mas também
no dia a dia daqueles
que precisam real izar
tarefas comuns como se
locomover na cidade,
comprar alguma coisa
ou até mesmo i r ao
médico.
De acordo com
Cláudia Paes de Barros,
o principal objetivo do
curso no início é
ensinar os alunos a
real izar essas tarefas
prát icas.
“São mui tos os
haitianos que enfrentam
problemas porque não
dominam a l íngua. Com
isso eles têm
dificuldades de
locomoção, pra arrumar
documentos e emprego,
Atendimento básico é
dificultado pelo idioma
não há ocorrência da
doença. Logo após a
disseminação do boato,
o Ministério da Saúde
negou a informação,
esclarecendo que desde
que os imigrantes
haitianos começaram a
chegar em 2010 à
cidade de Brasileia, na
fronteira do Acre com a
Bolívia, as autoridades
reforçaram os controles
sanitários e as
campanhas de
vacinação e de
realização de provas
para diagnosticar
diferentes tipos de
doenças. Desde 2010,
aproximadamente 20
mil haitianos chegaram
ao Brasil e, destes, 10%
estão em Mato Grosso.
Cuiabá o local ideal para
reconstruir a vida. “Logo
que eu soube da
oportunidade que o Brasil
estava oferecendo, decidi
vir para cá e assim como
os haitianos entrei pelo
Acre. Meu objetivo era ir
para São Paulo, mas
descobri que lá é muito
violento e frio, por isso
decidi ficar em Cuiabá e
as pessoas me receberam
muito bem aqui”, disse o
senegalês.
Sobre a vinda de
pessoas de outras
nacionalidades para o
Brasil, o tradutor Rafael
Lira disse que realmente
apareceram alguns
africanos e até um
português em busca de
emprego, contudo eles
não representam 1% dos
estrangeiros que estão
vindo para a capital.
coisas que necessi tam
minimamente da
comunicação oral”, diz
a coordenadora.
E quem sent iu na
pele essa si tuação foi o
estudante de
Administração Dorentin
Joel . Ele precisou se
automedicar , pois o
médico não conseguiu
entender qual era o seu
problema. “Passei muito
mal logo que cheguei ao
Brasil. Então fui
procurar um médico
que não entendia nada
do que eu falava, mas
ele ainda acabou
passando um exame de
sangue. Quando saiu o
resul tado, não consegui
entender a explicação.
Por f im eu acabei
comprando remédios
por conta própr ia”,
contou o estudante.
Projeto tenta amenizar problema
A fim de diminuir
as dificuldades dos
haitianos, a Universidade
Federal de Mato Grosso
(UFMT) começou a
oferecer um curso de
linguagem para os que
pretendem ficar no
Brasil. De acordo com a
coordenadora do curso
de capacitação da UFMT,
Cláudia Paes de Barros, o
projeto é muito pequeno
em relação à grande
quantidade de estrangeiros,
pois oferece apenas 50
vagas, que já estão
completas, mas o objetivo
futuramente será atingir
mais pessoas.
Em relação às turmas
montadas, Cláudia destaca
alguns dados importantes,
como a ocorrência de
pessoas que têm curso
superior. “Temos
professores, médicos e
engenheiros nas duas
turmas que montamos,
mas nenhum deles pode
exercer a profissão no
Brasil por causa da língua
e da falta de documentos,
que perderam no
terremoto”, destaca a
professora. Apesar dos
problemas, no entanto, ela
revela que o trabalho é
gratificante.
Parte dessa realidade,
Rolim Sainuil, 29 anos,
formado em mestre de
obras no Haiti, conta que
mesmo com o diploma
acredita que não irá
conseguir emprego que
reconheça sua formação.
“Não vim para o Brasil
exigir nada, qualquer
emprego que aparecer já
estou feliz. Mas gostaria
muito que uma empresa
me contratasse
considerando que sou
formado na área de
construção. Porém sei
também que por não
dominar o português
isso será muito difícil”,
lamenta.
mui tos hait ianos com
nível super ior ou com
experiência estão sendo
contratados apenas
como serventes , cuja
remuneração fica entre
o salár io mínimo e R$ 1
mil.
O t radutor da Casa
do Imigrante de Cuiabá,
Rafael Lira, confirma
que mui tas empresas
es tão usando de má- fé
na cont ratação da mão
de obra bara t a dos
hai t ianos e os
dispensando logo após
o per íodo de
experiência.
“Praticamente 99%
são cont ratados como
serventes apesar de
desempenharem serviço
de pedreiro. E ainda há
empresas que
dispensam os hai t ianos
dizendo que eles não se
adaptaram, mas na
verdade não querem é
pagar os direi tos deles.
Em relação a esse t ipo
de conduta, estamos
evitando mandar
trabalhadores para esses
locais”, explica Lira.
Ent re os hai t ianos
que es tão na Casa
aguardando emprego
es tá Dores t in Joel , 30
anos , es tudante do
úl t imo ano de
Administração.
Segundo ele, es tar no
Brasi l é uma
tranqui l idade, mas
fal tam pol í t icas para
receber os hai t ianos .
“Nossa cul tura é
di ferente da dos
bras i lei ros , mas como
estamos aqui
gos tar íamos mui to de
segui r a regra de
vocês , porém não há
um manual
disponibilizado na
nossa l íngua
informando o que
podemos ou não fazer ,
por causa di sso t enho
medo de tomar
qualquer at i tude e
infringir a lei”,
desabafa Joel .
Em relação ao
preconceito, a maioria
dos haitianos que está
na Casa do Imigrante
informou que são bem
recebidos no país e até
gostam da receptividade
dos brasileiros. E veem
aqui uma grande
oportunidade de
conseguir emprego para
reconstruir a vida no
Haiti, onde a família
ficou.
Empresas estão se aproveitando da falta de conhecimento dos estrangeiros
para fazer contrato de apenas três meses e não pagar os direitos trabalhistas
A falta do domínio do português tem prejudicado muitos
haitianos com diploma a encontrar emprego na área
Foto: André Romeu