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CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 2 A 8 DE AGOSTO DE 2012
SAÚDE
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www.circuitomt.com.br
Privatização pode ressuscitar a Máfia
Servidores, pacientes e doadores estão mobilizados para evitar a entrega do serviço de coleta de sangue à uma OSS.
Por Sandra Carvalho e Andhressa Sawaris. Fotos: Mary Juruna
BANCOS DE SANGUE
A privatização do
serviço de coleta de
sangue em Mato Grosso
proposta pela Secretaria
de Estado de Saúde e já
praticada dentro do
Hospital e Pronto Socorro
Municipal de Cuiabá
revoltou defensores do
Sistema Único de Saúde
(SUS), cuja principal
filosofia é a solidariedade.
Ao privatizar o serviço,
prefeitura e Estado tornam
lucrativa a ação solidária
de pessoas capazes de
doar o sangue para salvar
a vida do próximo.
Para o ex-secretário
estadual de Saúde, Júlio
Müller, o gerenciamento
dos bancos de sangue, de
responsabilidade do
poder público, não pode
ser parte de uma política
lucrativa o setor público o
responsável. “Terceirizar é
uma irresponsabilidade
com a saúde pública,
porque a iniciativa privada
não tem interesse em
garantir a segurança a
saúde, e, portanto, eu não
posso achar que isso é
política pública”, afirma.
A política de sangue
no Brasil foi
regulamentada porque se
entendeu, à época, que se
trata de uma questão de
segurança nacional. Assim
como a vigilância
sanitária, o tratamento
destinado ao sangue não
pode ser delegado a
terceiros, deve ser de
função exclusiva do Estado
de acordo com Júlio
Muller.
“O Hemocentro é
responsável pela análise
das bolsas. Ou seja,
verifica se o doador está
apto, se não apresenta
nenhum tipo de doença
que possa ser transmitida.
Assim são feitos muitos
diagnósticos de Aids,
hepatite e outras
patologias consideradas
graves”, pontua o ex-
secretário, que continua
incisivo: “Com vidas não
se pode brincar. o Estado
é responsável pelo
controle de epidemias e
deve ser responsável pela
administração dos bancos
de sangue”.
Quando secretário
Estadual de Saúde, Júlio
Muller gerenciou o
processo de criação de
rede de bancos de sangue
públicos, a “hemorede”.
“Demoramos seis anos
Falciformes: “Serviço
não pode visar lucro”
Receber sangue é vital
para as pessoas com
doença falciforme. Assim,
Rosalino Batista de
Oliveira, presidente da
Associação dos Falciformes
do Mato Grosso
(ASFAMT), afirma que é
preciso que tenha a
qualidade, sem interesse
em lucro.
“Mais cedo ou mais
tarde o falciforme vai
precisar receber sangue e
os prejuízos com a
privatização são
incalculáveis, pois quem
visa lucro não investe em
qualidade”, analisa
Rosalino, temendo ainda
que só recebam sangue
pacientes já com um estado
grave de saúde. “Vamos
deixar de ter a segurança o
que é uma coisa que não
Hemofílicos: “Hemocentro
é intransferível”
“Somos contra a privatização do Hemocentro e do
bando de sangue do Pronto Socorro de Cuiabá porque
eles têm uma função e uma obrigação social que são
intransferíveis”, defende Celso da Costa Ribeiro,
presidente da Associação dos Hemofílicos e Von
Willebrand de Mato Grosso.
Os hemofílicos tem uma deficiência no fator
sanguíneo - já nascem com essa característica - e
precisam tomar o fator de coagulação. Em casos mais
graves é necessário o plasma. E através do Pronto
Socorro de Cuiabá e do Hemocentro é feita a
distribuição do medicamento.
“Temos que discutir com a sociedade, porque a
concessão do serviço não pode ser imposta. Para
privatizar o Estado tem que provar que as coisas vão
ficar melhores, o que eu acho muito difícil”, acrescenta,
lembrando que o Pronto Socorro e o Hemocentro são
referências primordiais ao hemofílico porque o paciente
não pode ser deixado pra depois”
Hemofilia - é o nome de diversas doenças
genéticas hereditárias que incapacitam o corpo de
controlar sangramentos, uma incapacidade conhecida
tecnicamente como diátese hemorrágica.
temos como fiscalizar”.
Doença falciforme
é a
denominação usada para
caracterizar uma doença
causada pela presença de
hemoglobina (HbS)
nas hemácias de um
indivíduo.
Rosal ino, da Associação dos Falci formes,
não esconde a indignação
para consolidar a
proposta, e a rede passou
a atender a todos os
hospitais e aí conseguimos
deixar de comprar sangue
da rede privada”, lembra,
lamentando que agora o
Estado e a Prefeitura de
Cuiabá retrocedam ao
entregar o serviço a
laboratórios particulares.
“O que era um serviço
público, gratuito, agora
está no comando de um
laboratório privado.
Durante dez anos o banco
de sangue esteve sob
coordenação do MT
Hemocentro, que presta
um bom serviço, mas está
sendo deixado as traças
pelas gestões de Blairo
Maggi e Silval”, afirmou o
vereador.
Membro do
Movimento Saúde e
Democracia, o ex-
secretário de Saúde de
Cuiabá, Luiz Soares tem
que a privatização dos
bancos de sangue traga de
volta a chamada “máfia
dos vampiros”. Segundo
ele, anos atrás coleta de
sangue era privatizada e o
sangue, na época, teria
inclusive sido
comercializado de forma
desumana.
DOADOR SE SENTE
ROUBADO
O doador Marcos
Miranda conta que está
revoltado com a situação e
se sente roubado. “Eu faço
doações para salvar vidas
e não para sustentar uma
empresa privada”, conta.
De acordo com Miranda,
muitos doares vão
abandonar os bancos de
sangue, “porque a gente
sabe que sangue não
mercadoria pra ser
vendido assim, eu venho
doar pra salvar vidas,
porque amanhã eu posso
precisar”.
Marcos se juntou a
entidades representativas
de servidores, hemofílicos,
falciformes e outros
doadores de sangue para
uma manifestação em
frente ao Hemocentro de
Cuiabá na tarde desta
quarta (1), com objetivo de
protestar contra a
privatização dos bancos de
sangue.
Acontece que o
Governo do Estado
pretende repassar a
administração do
Hemocentro para o Instituto
de Hematologia do Centro
Oeste (IHEMCO), o que
gerou revolta entre usuários
e funcionários da unidade.
“O que questionamos
é por que uma instituição
que funciona, que tem
servidores e que vai
continuar tendo o mesmo
custo para o Estado, vai
passar a ser administrada
por particulares?”,
questionou o presidente da
Associação dos Falciformes
do Mato Grosso (ASFAMT),
Rosalino Batista de
Oliveira. Ele a mulher tem
dois filho com a
enfermidade e contam
que, pelo menos duas
vezes ao ano precisam
realizar transfusão de
sangue.
Após o protesto os
manifestantes seguiram
para o Hotel Fazenda
Mato Grosso com o fim de
tentar sensibilizar os
membros do Conselho
Estadual de Saúde ali
reunidos para que também
se coloquem contra a
privatização do
Hemocentro..
Servidores do Hemocentro são
radicalmente contra a privat ização
Dr. Júl io Mul ler, ex-secretário estadual de Saúde,
“tercei r izar é uma i rresponsabi l idade”
Doador diz que se sente roubado com
a privatização da coleta de sangue
Banco de Sangue do Pronto Socorro
de Cuiabá já foi privatizado