CIRCUITOMATOGROSSO
CUIABÁ, 15 A 21 DE MAIO DE 2014
CULTURA EM CIRCUITO
PG 4
www.circuitomt.com.br
COMOVOVÔ JÁ DIZIA
João Carlos Manteufel,
mais conhecido como João Gordo,
é um dos publicitários mais
premiados de Cuiabá
CALDO CULTURAL
Por João Manteufel Jr.
VIVER É RASONA ESTRADA!
ABCDEF....GLS
Por Menotti Griggi
Menotti Griggi é
geminiano, produtor
cultural e militante incansável da
comunidade LGBTT
cultura@circuitomt.com.br
Fazer teatro no Brasil, todos sabem,
é difícil, especialmente porque vejo
realmente que a mudança
comportamental do público passa pela
revolução midiática de inovações do
homem moderno que cada vez mais o
aprisiona a estar conectado de alguma
forma a um celular, um tablete, um ipod,
uma rede e muitas vezes afastando-o de
espaços onde estar desconectado por
uma hora seria quase impossível. Eu
disse quase.
É exatamente nessa linha que os
atores da Peça “Viver é Raso”, escrita e
dirigida por Amauri Tangará
vivenciam momentos da tão falada
“superficialidade humana”. Numa
montagem fora dos padrões
convencionais os atores Romeu
Benedicto, Julio Karkara, Thaisa
Soares, Tuka Calgaro, Hosana nas
Alturas, Fernanda Marimom e este
que vos escreve Menotti Griggi
incitam o desconforto no texto, na
fala, na atitude do esvaziamento
do ator que é proposta na
montagem da peça.
Depois de uma temporada em
2011 na Chapada dos Guimarães –
Mato Grosso, o elenco retornou
aos palcos, em Cuiabá para uma
curta temporada e em seguida
partiu rumo às estradas do Brasil onde já
passou por São Paulo no espaço CEU
Paraisopolis e também no Teatro
Municipal de Sertãozinho, e esta semana
chega ao Rio de Janeiro para uma curta
apresentação no SESC Tijuca elevando
assim a cena teatral de Cuiabá, mas que
é a imagem e texto de qualquer lugar do
mundo.
Em cada espaço, após a
apresentação, o elenco e o diretor
promovem um debate que tem sido
extremamente enriquecedor. A troca de
ideias e informações com cada
expectador e acima de tudo a sua visão e
impressões de cada cena do espetáculo.
Essas trocas de informações evidenciam
ainda mais uma das principais discussões
de Viver é Raso: a superficialidade em
que vivemos e o quanto ela nos faz mal,
ao nos afastar do conhecimento para
podermos pensar, e não sermos meras
ovelhas num grande rebanho nem sempre
conduzido por alguém que nos queira
rebelados.
Esse paralelo entre ser e estar ou
raso e profundo é algo que se não
pensarmos com firmeza nos leva sempre
a balançarmos a cabeça para sim e como
dizia um dos grandes escritores
brasileiros, Nelson Rodrigues – “toda
unanimidade é burra”
Viver é Raso está no Rio de Janeiro e
no mundo! Avise aos amigos!
A falência das relações é algo
gritante. Caminhamos a passos largos
para a falta total de comunicação
pessoal, multiplatafórmica exceto pela
ação física, em que um like substitui um
abraço, em que uma compartilhada é
mais importante que um sorriso. As
pessoas estão se tornando impessoais
demais e sociais de menos. Vovô Einstein
já previa, com sua genialidade, há cem
anos: “Eu temo o dia em que a tecnologia
vai ultrapassar a interatividade humana.
O mundo terá uma geração de idiotas”.
Mas o problema não é a tecnologia. O
problema são os humanos.
Num badalado prêmio de
propaganda, que analisa ideias que
vendem, integram e ensinam a sociedade
que o que vale não qual é o seu caráter,
mas sim aquilo que você tem, a dita
comunicação social, o humano, que
forma o social, foi totalmente
descartado.
– São os tempos modernos. O
sistema não tem tempo para bobagens –
dispara Flor, minha mágica companheira.
Não desisto fácil. Antigamente, na
hora de anunciar um vencedor, diziam a
agência, quem criou, quem produziu.
Valorizavam a cadeia produtiva e as
pessoas que por ela, e por causa dela,
sobrevivem. Naquela noite, só foi falada
a agência vencedora. E uma agência,
como qualquer outro ramo de atividade,
é feita de pessoas, para induzir pessoas,
enriquecendo pessoas.
– Para, João, não sonha, geração
hippie e socialismo acabaram faz tempo.
Lucro pelo lucro. E o que dá lucro são
as agências e não as pessoas que fazem a
agência – diria Pedrão, amigo de longa
data, diretor de criação de uma mega-
agência powerultra famosa.
Sou romântico, eu sei. O tempo
daquela Cuiabá bucólica, onde minha avó
sentava na calçada da 24 de Outubro,
onde conhecíamos todo mundo, não
volta mais. Moramos num estado em
constante ocupação desde quando os
bandeirantes encontraram os bororos
na beira do rio. Moramos num estado
onde a cultura valorizada não é a
tricentenária arte, um estado onde
sua identidade some na poeira do
desenvolvimento monocultural e
monopessoal, reflexo do descaso de
quem trata a si próprio dando uma
cabeçada com fúria no espelho,
automutilando-se em prol de um
mundo que não lhe pertence.
Deve ser por isso que hoje não
existem mais pessoas, apenas
agências. Afinal, às vistas do
colonizador, o índio sempre foi mão
de obra de segundo escalão.